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quarta-feira, 27 de julho de 2011

TROPPO UMANO...




Uma senhora publicou no Facebook a seguinte sentença:
SEJAM VOLUNTÁRIOS DE DEUS E NÃO DO PRÓPRIO UMBIGO!

Faço todo o possível para evitar este tipo conversa, mas sou muito obsequioso quando se trata de sentenciar que ‘seja bom em deus, no meu deus, ou seja mau e egoísta’... E não pude resistir, e comentei:

Não podemos ser voluntários da humanidade? Voluntários em atividades assistenciais, hospitais, asilos, orfanatos? Voluntários apenas na condição natural de seres humanos? Só existem duas opções, o seu deus, e o 'próprio umbigo'? Ou seja, ‘ser voluntarioso com o seu deus, ou ser egoísta’... É isso? Por que? O que o seu deus tem de especial, além da faculdade do ilusionismo, fingindo não existir, enquanto a humanidade enfrenta toda sorte de problemas? Este deus, que não se mostra, não atua, que não faz nada, que não parece realmente um deus... Devo acreditar no sobrenatural? Em seu amiguinho imaginário, ou sera mau e egoísta? Por que?


As taxas de mortalidade nunca caíram em função de orações, mas sim de ciência e ações concretas do racionalismo humano... Os continentes que mais rezam apresentam os piores indicadores sociais, e de qualidade de vida, fome, miséria, pobreza, mortalidade infantil, violência... E isso é um fato...

Porque não podemos então ser voluntários, de Maomé, Krishna, Thor, O Grande Juju da Montanha, Hórus, Pai João, Oxossi? Ou ser voluntários de Hippolyte Léon Denizard Rivail (mas conhecido por Allan Kardec, nome mais sonoro, questão de marketing)? Porque o seu deus é sinônimo de solidariedade e os outros não? Por que ser humano não basta? Seria pela obras sociais nas Cruzadas, Inquisições, casos de pedofilia, estelionato, Indulgências, assassinatos, conchaves históricos, maracutaias, etc e tal?


Perceba, que se você tivesse nascido em Nova Deli diria ‘seja voluntário de Krishna’, e no Antigo Egito, ‘seja voluntário de Hórus’, ou ainda, no mundo nórdico, ‘seja voluntário de Thor, Odin, contra os Gigantes de Gelo’, ou ‘de Zoroastro na Pérsia... Isso não ativa o seu pensamento? Nem um pouco?Não faz o menor sentido pra você? Não é possível perceber a contradição? Alguns destes deuses estão extintos assim como muitos outros, e exatamente como o seu será... Trata-se de uma questão de ignorância localizada no tempo e no espaço geográfico, mas ainda assim severa ignorância... Sua religião está todos os dias mais próxima extinção, porque felizmente mais pessoas estão completando o ensino médio...

Deixei de trabalhar em um período valioso de minha vida, para fazer alguma coisa, em meu idealismo, já que o seu deus não fazia nada... E dediquei-me a trabalhos voluntários no Centro Boldrini em Campinas, e depois no HC Camargo (ou Hospital do Câncer) em São Paulo... Eu passava a minha vida dedicado a isso... Não era uma segunda atividade... Mantinha-me com o dinheiro que havia juntado, e minimizei ao máximo os meus gastos pessoais para SERVIR... Nunca me senti tão vivo em contraste com a morte... E nunca tive tanta certeza do absurdo de ‘crer na crença’... Em qualquer uma... Nunca tive tanta certeza de que se deus existisse, ele estaria bem longe destes hospitais... Estaria por aí, cuidado das outras 1022 estrelas que ele criou... Mas sem a menor sombra de dúvida não está aqui na Terra... No planeta Terra...

Convivi com uma jovem mãe que aguardava a morte do seu filhinho querido, de cinco anos, Wallinson, para trazer o seu segundo filho de três, também portador do mesmo tipo de câncer, para simplesmente assistir a sua morte... E não me venham com a falácia do ‘escreve certo em linhas tortas’, porque isso é covarde e cruel, e não cola mais... O terceiro filho, com um aninho não desenvolveria a doença, porque já haviam diagnosticado geneticamente, que ele não era portador, mas ela, a mãe, em sua ignorância, simplicidade e fé, achava isso uma grande dádiva, e prova de que deus havia escutado as suas orações... Esta jovem mãe, de joelhos diante da morte e impotente, sofria todos os dias, e só não entendi onde havia falhado, se havia rezado para os outros dois filhos também, e se martirizava... Sentindo culpa por não ter tido ‘suficiente fé’... Me dizia em seu desespero ‘eu rezei os terços, mandeis rezar missas, orei até que meus joelhos sangrassem, fiz o bem, fiz de tudo, e onde eu falhei? Fiz igual para os três’... Mas não dependia dela, e nem de rezas... Dependia da genética e da estatística... E a única forma de ajudar mães com os mesmos dramas, é estudar, e encontrar a cura para tais doenças... Ela não falhou, nem em sua fé, e nem em ter fé na fé... Ela foi ensinada, doutrinada, a crer na crença, a crer em deus, a confiar em deus, cegamente... Mas o nosso sistema educacional falhou em não levar a esta mãe, e a tantas pessoas, conhecimento básico, elementar... Para que ela pudesse entender que não era culpa dele, nem eram ‘anjinhos que deus queria levar’, como dizia uma senhora benzedeira que cumpria o seu ritual ‘voluntário’ por lá... 


Eles apenas nasceram um defeitinho no código genético, herdado e com uma chance em muitas, de desenvolver um tipo agressivo de câncer que ataca o cérebro, tirando a visão, depois os movimentos a fala e a vida... Wallinson de 5 aninhos, já estava cego quando cruzei seu curto caminho, mas parecia enxergar mais do que a sua frágil mãe... Se, estatisticamente, um trecho do código genético, que bloqueia a enfermidade estivesse impresso no DNA dele, deles, o câncer seria bloqueado, e seguiriam vivendo... Mas seus dois filhos foram escolhidos pela ‘estatística’... Esta não é uma crença, este é um entendimento... Isso é conhecimento... Sempre será da mesma forma se o código genético contiver algumas letrinhas que indiquem este câncer... Não importa o quanto você reze ou não... Só a ciência, e homens dedicados e realmente solidários, farão a diferença...

Esse menino sofreu, e com resignação... Lembro-me pra sempre, que ele não queria comer mais nada, cego, parecia saído de um documentário de Auschwitz, e muito fraquinho para desejar, quiçá para falar... Mas balbuciou para a mãe, que queria comer ‘pamonha’... Ele estava na UTI, em estado terminal, e chovia muito em Campinas... Eu não conseguia imaginar onde comprar pamonhas, além de Piracicaba, rsrsrsrs... Peguei a moto que me transportava na época, e corri o mundo em Campinas, até que descobri um possível ‘ponto’ de pamonhas, rsrsr... No Carrefour da Rodovia Dom Pedro... Chovia muito, a estrada cheia de caminhões sem a menor misericórdia, e lá fui eu... Protegido apenas pela minha atenção, perícia e senso de responsabilidade, e cheguei até as pamonhas, e retornei com elas... Wallinson já estava desacordado, não pude despedir-me dele, nem assisti-lo, como sempre de mansinho, lentamente, curtir o seu último desejo... O seu deus, havia negado a este garotinho que sofreu durante seus 5 aninhos de vida, seu último desejo... Imaginei Wallinson em meus sonhos, muitas vezes, comendo a tão sonhada pamonha, e sorrindo...
  
O seu deus é bem mais cruel do que foi com Wallinson... Leia a Bíblia... São quase 2,5 milhões de assassinatos cometidos por deus ou a mando de deus, por pura intolerância religiosa, vaidade, capricho, vingança, castigo e crueldade... Todos são cegos, ou não querem abrir os olhos e ler... Mas você acha que o seus deus é um ‘deus de amor’... Tanto assim, que no primeiro dia do Apocalipse, tratará de exterminar no ato, 1/3 da humanidade, e com sofrimento inimaginável; ou seja, bilhões de pessoas... Este é o maior massacre de todos os tempos... Se genocídio é a morte de um povo, este seria um 'Humanicídio'... Mas ele ama você, ele ama a humanidade... Tremenda e absurda contradição...

Na próxima vez que orar pelas vítimas no Japão pergunte-se, quem moveu as placas tectônicas? Ou, porque o meu deus tão misericordioso permitiu que elas se movessem? Ou ainda, depois de terem se movido, vieram as Tsunamis... Por que deus não parou as Tsunamis, desviou, ou diminuiu a força? Porque ele simplesmente não existe... A fé não remove montanhas, ela remove o cérebro... Assisti a um cena do terremoto no Haiti, onde deus havia permitido que, entre milhares de mortos, uma maternidade tivesse sido atingida... Morreram centenas de mães e bebês... Mas uma senhora foi salva... Seu bebê morreu... E esta gente totalmente ignorante, agradecia a deus por ter salvo uma pessoa, e esqueceram-se dos milhares de mortos... Como funciona isso? Se morrem milhares e se salva uma, damos graças a deus? Bom, mas se ele interferiu, então ele pode interferir, e não quis interferir na morte de outras milhares... Logo, segundo o bom senso, o senso comum, e nossas leis, isso é cumplicidade em genocídio... É crime...

Finalmente, como ex-super-crente, ex católico, ex muitas coisas, me incomodam especificamente algumas questões relacionadas com a crendice generalizada e cega... Primeiramente esta questão de relacionar ‘ser bom, com ser religioso’... Depois, valer-se deste claro oportunismo, de negar todas as atrocidades relacionadas ao seu deus, simplesmente para negociar sua salvação... Um complexo de ignorância que vai do mais absoluto desconhecimento de Mitologia, de História, da História das Religiões, e da História do Pensamento Humano; em SABER, que as nossas melhores práticas e costumes não vieram de livros sagrados... Depois, trata-se de um completo desconhecimento das Ciências Biológicas e Exatas, e todas as suas especializações... De forma que este estado de coisas me remete antes, e sempre, à educação...

Sinto-me afortunado por viver esta vida maravilhosa, mas gostaria de estar cercado por menos ignorância, e sua conseqüente frustração, e falsidade... Para estar cercado de mais solidariedade, consciência e ação... Existem tantos problemas, e tantas fronteiras do conhecimento, para avançar ainda mais em nossa qualidade e tempo de vida...

E obrigado a quem publicou aquele malfadado slogan fundamentalista e preconceituoso, porque instigou a minha mente... Mas quem cuida do próprio umbigo é quem negocia sua salvação, e quer fazer bonito publicamente, para descolar um lugar no céu... Quem aceita o seu destino, e luta de pé, e não de joelhos, com as mãos em gesto de dar, e não espalmada em oração; quem mesmo sendo um reles mortal, sem a vida eterna e sem recompensa nenhuma, decide servir, está na verdade sendo humano... Como diria o meu amigo italiano Pino Mercure: TROPPO HUMANO...

Carlos Sherman






































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