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sábado, 1 de dezembro de 2012

Baker vs Kaiser




Lógica Serpeante
Dan Barker

Em 14 de maio deste ano participei de um debate em Sheboygan, Wisconsin, sobre o tema Deus e a Bíblia: Fato ou Fabula? Meu oponente foi o Dr. Walter Kaiser, um conhecido estudioso do evangelho, professor do Velho Testamento, que é agora Presidente do Seminário Teológico Gordon-Conwell em Massachusetts.

Só para ter certeza do que estaríamos debatendo, procurei a palavra fábula no dicionário. Fiquei de certa forma surpreso em saber que a definição primária envolve animais falantes. O Dicionário Webster's New Universal Unabridged diz "fábula n. 1. narrativa fictícia destinada a ensinar alguma verdade ou preceito moral, no qual animais e as vezes objetos inanimados são representados como atores ou narradores." Os outros dicionários concordam.

Nem todas as estórias sobre animais falantes são fábulas (somente contos morais), e nem todas as fábulas contém animais falantes (então mesmo sem eles, a Bíblia poderia ainda ser uma fábula); mas há uma premissa nas definições dos dicionários que concorda com o senso comum: os animais não falam a língua humana. Se há alguma prova de que a Bíblia é uma fábula, ou que contenha fábulas, então a presença de animais falantes seria certamente parte de tal prova.


Mencionei esses fatos no meu discurso de abertura, e então li o Gênesis 3, que relata o conto moral mais crucial de toda a Bíblia, a estória da queda da raça humana: "A serpente era o mais astuto de todos os animais selvagens que o Senhor Deus tinha feito. Ela disse à mulher: É verdade que Deus vos disse 'não comais de nenhuma das árvores do jardim'." (Gen 3:1)?

Essa estória da tentação de Eva, bem no início das escrituras, é a peça central das teologias judaica, cristã e muçulmana. Sem ela, não haveria razão para salvação, Moisés, Jesus ou Mohammed. É claramente "um conto moral" e contém um animal falante. Eu poderia ter decretado vitória e sentado, mas tendo sido um pastor, é difícil para mim desistir, especialmente quando ainda tinha tempo no relógio. Então fiz o que a maioria dos pastores fazem: continuei falando. Abri a Bíblia e li sobre um asno que não sabia quando parar de falar: "Balaão respondeu para a mula: Porque me estás provocando! Se tivesse uma faca na mão, agora mesmo te mataria. E a mula respondeu a Balaão: Não sou eu a tua mula, que até hoje sempre montaste? Será que costumo agir assim contigo? E ele respondeu: "Não". (Num 22:29-30)

Essa estória talvez não seja tão moralmente crucial quanto a do Jardim do Éden, mas isso não a torna mais crível.

A Bíblia relata animais falantes: "Diante do trono havia como que um mar de vidro semelhante ao cristal. Diante do trono e ao redor, quatro seres vivos, cheios de olhos na frente e atrás. O primeiro ser vivo parecia um leão, o segundo um touro, o terceiro tinha o rosto como de homem e o quarto parecia uma águia voadora. Os quatro seres vivos tinham cada um seis asas, e em volta e por dentro estavam cheios de olhos e não cessavam de clamar dia e noite: 'Santo, santo, santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, que era, que é e que vem'." (Apo 4:6-8)

A maioria dos cristãos acha que Satanás é uma criatura espiritual, mas a Bíblia o descreve vividamente como um animal falante: "Apareceu no céu outro sinal: e eis um grande dragão cor de fogo, com sete cabeças e dez chifres e sobre as cabeças sete coroas. A cauda varreu do céu a terça parte dos astros e os precipitou sobre a terra. O dragão parou diante da mulher na dor do parto a fim de lhe devorar o filho quando o desse à luz... O grande dragão, a antiga serpente, chamada diabo e Satanás, que seduz o mundo todo, foi então precipitado para a terra e com ele os seus anjos. E ela abriu a boca em blasfêmias contra Deus, para insultar o seu nome e a sua tenda e os que moram no céu. " (Apo 12:3,4,9 e 13:6)

A Bíblia contém contos morais que envolvem animais. Portanto, a Bíblia é uma fábula.

Depois dos discursos de abertura, Kaiser e eu nos engajamos num período de examinação cruzada, onde éramos cronometrados pelo moderador. Durante o meu discurso de abertura, eu tinha dito: "Os cristãos têm medo de que as pessoas pensem por si mesmas. Os ateus têm medo que elas não pensem."

Kaiser: Você diz que a maioria dos cristãos têm medo do pensamento humano. Eu não teria pensado isso. Alguns dos melhores pensadores que tivemos desde muito tempo - desde tempos A. C. - foram pensadores cristãos...

Barker: Que acreditavam em cobras falantes.

Kaiser: Que acreditavam em dar à prova o seu prioridade merecida.

Barker: Você acredita que houve uma cobra que falava?

Membro do Público: Sim.

Barker: Estou perguntando a este rapaz. Ele é... Você acredita que uma cobra falava a língua dos homens?

Kaiser: Acho que você não entendeu o que Gênesis 3 estava falando. Estou surpreso com a sua compreensão.

Barker: Mas apenas me diga: uma cobra falava a língua humana? Sim ou não?

Kaiser: A Bíblia disse "cha nachash" a "serpente" falou, sim. Uh, huh. O que é muito diferente do que você está tentando colocar nessa construção.

Barker: Mas, o que é uma "serpente"?

Kaiser: Uh - é uma tradução de "cha nachash." Você fala hebraico?

Barker: Sei um pouco. Mas não conheço essa palavra.

Kaiser: Uh, huh. Bem, foi o que pensei, porque a questão toda é, eu acho que este é um título dado ao Diabo, e não acho que ele, de forma alguma, no próprio texto, indica que ele era um réptil.

Barker: Então este era o Diabo, Satanás falando?

Kaiser: Penso que sim.

Barker: Você quer dizer o dragão vermelho com sete cabeças e os dez chifres e tudo mais? Era esse que estava falando no jardim?

Kaiser: Não. Primeiramente, atenha-se no texto aqui, em Gênesis, no que ele diz. Não misture as coisas indo de um texto a outro e com isso confundindo-se.

Barker: Não colocar num contexto?

Kaiser: Se estamos realmente querendo saber, devemos nos ater ao texto, é claro.

Barker: Então, o que era? O que era essa coisa que estava conversando com Eva? Ela diz a besta--"A serpente era a coisa mais astuta do que qualquer outra besta do campo que o Senhor Deus fez." Ele está comparando - no contexto ele está -

Kaiser: Na tradução para o inglês, estava lá - "cha nachash" era a mais astuta, "mi kol" - "de todas"- e você está tomando-a num senso partitivo, "de qualquer das bestas do campo," o que também poderia ser (e eu acho que mais precisamente) traduzido, "do que as bestas do campo." É uma tradução comparativa aqui.

Barker: Certo, é o Deus--

Kaiser: Ele está falando sobre todas a criação de Deus e colocando-a contra aquela de suas outras criaturas, o Diabo.

Barker: Se você estiver certo sobre isso - acho que não está, mas se estiver - o deus que você acredita, ele é capaz de fazer com que um animal fale a língua dos homens? Ele pode fazer isso? O Asno de Balaão falava a língua dos homens com Balaão?

Kaiser: Uh, você está me perguntando do que Deus é capaz e Deus é capaz de tudo, exceto se contradizer.

Barker: Então, ele poderia fazer com que um animal falasse - ele poderia fazer o asno de Balaão falar com Balaão. Você acredita que um asno falou a língua humana?

Kaiser: Deus não pode fazer cordas com uma só ponta.

Barker: Mas estou falando de burros falantes. Deus pode fazer um burro falar?

Kaiser: Temos - acabei de escrever um artigo sobre um achado arqueológico sobre episódio em particular, do século 9 A.C., com Balaão, filho de Beor, e é de uma cópia do um texto de aluno primário, e sim, eles falavam sobre o fato que este foi o evento mais incomum no qual Deus falou pela boca de um animal.

Barker: Então o animal falou a língua dos homens, sim ou não?

Kaiser: Você ouviu, claro. Sim.

Barker: Certo, então você acredita. Então, você acredita na definição do dicionário para "fábula," certo? Uma estória que tem animais falantes é uma fábula.

Kaiser: Agora você está confundindo duas coisas, porque na definição de fábula, você tem um animal falante, mas este não é seu único critério para o que constitui uma fábula. Fábulas são uma parte da figura de linguagem. Usamos figuras de linguagem: "Você explodiu de raiva," mas não estou vendo seus pedaços. Você faz vários tipos de coisas que são em termos de figura de linguagem, e você tem que considerar que isso estava em uso em línguas antigas bem como em modernas.

Barker: Então, a Bíblia contém muitas alegorias com pretensos animais falantes, que, para mim é uma fábula. Animais que fingem estar falando, ou que você está -

Kaiser: Estas foram suas palavras: "Muitas alegorias." Agora você está colocando um julgamento de valores nisso e seu julgamento de valores está encobrindo sua habilidade de pensar racionalmente. Pensei que você era um racionalista. Agora você está se tornando um emocionalista. (risos)

Barker: Esta manhã, quando eu estava dirigindo para cá, parei para abastecer. Entrei para tomar um café, e quando eu estava entrando na loja de conveniência-

Kaiser: Sim.

Barker: ...esse gato veio até mim e falou com a língua dos homens, e disse: "Fique longe dos sanduíches de atum." Você acredita nisso? Você acredita que isso aconteceu comigo?

Kaiser: Não conheço seus gatos tão bem. (rindo)

Barker: Mas você acredita que isso aconteceu comigo?

Kaiser: Uh, tenho minhas dúvidas sobre isso.

Barker: Por que?

Kaiser: Preciso de mais provas.

Barker: Por que você duvidaria que um gato pudesse falar?

Kaiser: Porque precisamos de mais provas; por isso.

Moderador: Tempo.

Barker: Ah! Bem, não temos nenhuma evidência da verdade na Bíblia.

Até mesmo Kaiser, que leva a Bíblia ao pé da letra, age como um ser humano normal quando se trata de estórias de animais falantes fora de sua própria religião. Ele sabe que animais não falam. Ou pelo menos ele sabe o suficiente para ser bem cético e exigir provas fortes para tais alegações incomuns. Mas qual é a diferença entre a cobra bíblica que fala e a minha estória do gato falante? Nenhuma das duas pode exibir qualquer prova fora do próprio conto. Sem evidências, ambas são fábulas.

A contradição de Kaiser é bastante óbvia. A única razão pela qual estudiosos cristãos acreditam que uma serpente falante fluente em hebráico era Satanás é por causa de dois escritores do Novo Testamento pensam que sim. Não há nada no Gênesis, ou no seu contexto imediato, que sugere que nachash era outra coisa que não uma cobra. Kaiser me acusou de ficar "indo e voltando" nos textos quando, pelo que ele próprio disse, eu estava tentando conectar o Gênesis 3 com o "dragão vermelho" do Apocalipse 12:3; porém ele supostamente não o está interpretando fora do contexto quando faz a mesma coisa com o "Diabo" do Apocalipse 12:9. Ele quer ter o bolo e comê-lo também. (Comida do Diabo.)

Depois do debate, investiguei as alegações de Kaiser sobre nachash. Li o Gênesis 3 em onze versões inglesas diferentes - incluindo a VRJ, uma tradução judaica dos textos Masoréticos, o NRSV, bem como o não tão erudito, apesar de popular, NIV e a Bíblia Viva - nenhuma delas chama nachash de Diabo: elas todas usam "serpente" ou "cobra." Também procurei em todos os outros lugares nas escrituras hebraicas onde nachash aparece e ela sempre é narrada como "serpente" ou "cobra", um animal que "morde os calcanhares dos cavalos", que move "sobre a rocha", que come poeira e se move "para fora de suas tocas como minhocas da terra."

Freqüentemente Nachash é poeticamente comparado a "víbora" em versos tais como: "seja como serpente no caminho, como víbora no atalho, que morde os calcanhares do cavalo e faz cair para trás o cavaleiro." (Gen 49:17), "O veneno deles é como o veneno da serpente: são como a víbora surda que deixou-a surda." (Salmos 58:4), "Afiaram as suas línguas como uma serpente, o veneno da víbora está nos lábios deles" (Salmos 140:3), "Acaba mordendo como serpente e picando como víbora." (Provérbios 23:32).

Não sou um perito em hebraico, mas essa examinação superficial parece provar que Kaiser estava errado. Para ter uma opinião erudita, escrevi e pedi ajuda ao Dr. Hector Avalos. Avalos, que é professor do programa de Estudos Religiosos na Universidade do Estado de Iowa, tem Ph.D. em idiomas bíblicos pela Harvard e é o autor de "Animais" e "Satanás" da Oxford Companion to the Bible (Nova York: Oxford, 1993). Ele foi generoso o suficiente para preparar um texto bem informativo sobre o assunto, na forma de carta, a qual anexei abaixo (eliminei ou transliterei os caracteres hebraicos de Avalos, os quais não poderia reproduzir aqui, e acrescentei meus comentários em cochetes).

Caro Dan,
Se a contenda [de Kaiser] é que nachash em Gênesis 3:1 não deveria ser considerado como um animal por causa do uso de uma construção "partitiva", então ele estaria equivocado e em oposição à 99% de todos os estudiosos bíblicos (conservadores, liberais ou seculares) e das traduções das quais tenho conhecimento [há um estudioso respeitado, A.W. Sjoberg, que diz que nachash em Gênesis 3:1 é na verdade um camaleão, não uma serpente, mas isso continua fazendo dele "um animal."]
Eu também gostaria de saber que tipo de criatura nachash seria segundo Kaiser. Se ele não é "um animal," então ele acredita em alguma criatura tal como um querubim ou um serafim? Como ele está definindo "animal"? É verdade que nachash pode ser descrito como uma criatura mitológica. Por exemplo, em Isaías 27:1 "Naquele dia o Senhor castigará, com sua espada afiada, grande e forte, o Leviatã, serpente fugidia, o Leviatã, serpente tortuosa, e matará o Dragão que está no mar." [todas as citações, a não ser quando especificado, são da versão NRSV]
Porém, esse não é o caso no Gênesis 3. Fora sua habilidade de falar, nachash nesse capitulo é um animal, no sentido de uma criatura não humana que normalmente habita a terra e que seria prontamente reconhecida. Além disso, em Gênesis 3:1, temos o seguinte dizer no mesmo capítulo.
Gênesis 3:14, "E o Senhor Deus disse à serpente: "Porque fizeste isso, serás maldita entre todos os animais domésticos e entre todos os animais selvagens. Rastejarás sobre o ventre e comerás pó todos os dias da vida."
Gênesis 3:15, "Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e os descendentes dela. Eles te ferirão a cabeça e tu lhes ferirás o calcanhar." Este verso indica que o nachash de Gênesis 3 é uma criatura que: 1) espera-se interagir com os seres humanos constantemente e 2) rasteja sob sua barriga. Então, o nachash aqui não é apenas aparentemente uma criatura sobrenatural, mas uma que deveríamos ser capazes de reconhecer como um animal normal de acordo com o autor. Uma serpente é compatível com essa descrição de nachash e uma serpente é, no nosso senso comum, um animal normal. A mesma palavra hebraica é usada para uma criatura que "pica" pessoas em Números 21:5ff.
Uma objeção que poderia ser feita é que as características de nachash mudaram depois de ser amaldiçoada, mas então isso somente iria colocar mais problemas para os cristãos conservadores (ex: houve uma mudança na espécie--evolução?)
Aparentemente, outros autores bíblicos também entendem que nachash no Gênesis 3 pode ser uma serpente normal no nosso senso comum. Por exemplo, em 2 Corintios 11:3: "Temo, entretanto, que assim como a serpente enganou Eva com astúcia, assim também corrompa vossos pensamentos, afastando-os da sinceridade e da santidade devidas a Cristo." O autor aqui usa a palavra grega ophis, a palavra normal para cobra ou serpente (apesar de poder ser usada para uma criatura mitológica como em Apocalipse 12:15). Os judeus fluentes em hebraico que traduziram Gênesis 3:1 para o grego na versão conhecida como Septuagint também usaram ophis.
A ocorrência da chamada construção partitiva em Gênesis 3:1 não pode ser usada para concluir que nachash não é um animal ou "fera do campo." Para entender, vamos revisar a gramática básica da parte relevante do verso (usando minhas traduções literais).

mkol (min + kol): "todo" + "de" or "do que"

arum: "astuta" (adjetivo)
hayah: "era" (verbo)
cha nachash: "(e) a serpente" (substantivo + waw [sexta letra do alfabeto hebraico])
cha sadeh: "o campo" (artigo definido + substantivo)
chaiyah: "fera(s) de" (substantivo em construção)

[NRSV: "animais selvagens". Estou usando o plural genérico "feras" apesar de outras traduções poderem usar singular o mais apropriado. "Substantivo em construção" refere-se à forma particular que um substantivo hebraico tem quando usado para expressar uma relação possessiva com o substantivo seguinte, e geralmente traduzido como "X de Y" numa forma mais esquemática.]

A razão aqui para se ver uma construção partitiva é o uso de "de todos" ("do que qualquer outro" no NRSV). O livro texto hebraico de Gesenius considera a preposição ["de" ou "do que"] no Gênesis 3:1 como parte de uma expressão partitiva [W.Gesenius, E. Kautszch e A.E. Cowley, Gramática Hebraica Genesius (2ª edição, inglês: Oxford: Clarendon, 1910) parágrafo 119, v(1).]
Uma construção partitiva é uma que expressa separação, mas temos que ser específicos quanto a natureza da separação. Gênesis 3:1 deveria ser lido como se estivesse descrevendo uma separação em relação à uma característica em particular da serpente dentro da categoria de substantivos que segue "de todas" na frase em construção. O Nachash está separado de "todas as feras do campo" quanto a uma característica particular expressada pelo adjetivo "astuta," mas nachash não está separado das "feras do campo" como um todo. A serpente ainda é uma das "feras do campo" que é resultante de "de todas."
Essa é uma maneira complicada de dizer que é melhor ver "de todas" no Gênesis 3:1 como parte de uma expressão comparativa ou superlativa como o fazem Bruce Waltke e M. O'Connor em Uma Introdução a Sintaxe Hebraica [Parágrafo 14d. 44, Winona Lake, Indiana: Eisenbrauns, 1990, p270.] Em casos como este, o sujeito da comparação está incluído na categoria de substantivo que é resultante de "de todas." Por exemplo, em 1 Samuel 10:23, isso é usado para dizer que Saulo é "o mais alto de seu povo." Da mesma forma que o sujeito (falando de Saulo) na expressão comparativa "Ele foi o mais alto de seu povo" não significaria que Saulo não é uma pessoa ou parte do "seu povo," então, também, o sujeito na expressão comparativa "a serpente era a mais astuta de todas as feras do campo" não significaria que a serpente não seja uma das feras do campo.
Considere também 1 Reis 10: 23: "Portanto, em riqueza e sabedoria o rei Salomão levava a palma a todos os reis da terra." O verso claramente significa que Salomão era o mais rico e mais sábio de todos os reis na terra (separe o que e a que riquezas e sabedoria se referem), e não que Salomão não era rei. Salomão ainda está incluído na classe de coisas (ex: "reis da terra") que é resultante de "de todos" como uma frase em construção.
De forma semelhante, no Gênesis 3:1 a serpente pertence a classe de coisas (feras do campo) que é resultante de "de todos" numa frase em construção, mas é apenas uma característica particular expressada pelo adjetivo ("astuto") que é distinta em qualquer sentido.
Conclusão: O dr. Kaiser pode saber um pouco de hebraico, mas, da mesma forma que qualquer estudioso, ele precisa apresentar bons argumentos empíricos e exemplos para sua conclusão. O dr. Kaiser citou algum outro exemplo em algum outro lugar na bíblia hebraica onde o sujeito em tal "construção partitiva" não poderia ser incluído na categoria geral de substantivo seguido de "do que todos" em uma frase construtiva? Baseado em analogias com construções hebraicas similares e nas traduções em grego feitas por pessoas fluentes em hebraico, é melhor entender as referências a esperteza da nachash em Gênesis 3:1 como parte de uma expressão comparativa que continuaria incluindo aquela criatura entre as "feras do campo." Estas feras do campo podem ser podem ser descritas apropriadamente pelo senso comum como "animais." Mas até mesmo se alguém descrever esta passagem em questão como uma construção partitiva, tal construção não garante a exclusão da nachash da categoria geral, "as feras do campo," que resulta de "de todos".
E mesmo se o nachash for algo "diferente de um animal," isso continuaria significando que os autores bíblicos, se interpretados literalmente, acreditavam em criaturas que tinham características e habilidades antropomórficas que não são verificáveis cientificamente; ou acreditavam em criaturas que portavam características e habilidades antropomórficas ditas de animais em estórias que os cristãos poderiam de outra forma chamar de fábulas e mitos. Não há, é claro, nada que indique que o autor do Gênesis está igualando nachash com o Diabo conforme descrito no Novo Testamento (veja Apocalipse 20:2 para esta equivalência feita pelos autores cristãos).
Espero que isso ajude a revelar os complicados argumentos gramaticais que alguns evangélicos gostam de usar.

Em maio enviei uma cópia desta maravilhosa análise de Avalos para Kaiser, perguntando se ele gostaria de esclarecer seu comentário. Também mencionei que parecia pelos seus comentários sobre "figuras de linguagem" que ele na verdade embasa a minha alegação de que a Bíblia contém alegorias, tais como animais falantes, que não eram para ser tomadas literalmente. E mesmo se a serpente falante no Jardim do Éden pudesse ser imaginada como um "Diabo" espiritual ao invés de um animal físico, não há explicação o fato (como Kaiser admite) de que o asno falante de Balaão era um animal.

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