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segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Sessão de Terapia





Uma amiga escreveu pedindo apoio para certas questões em sua vida pessoal, e em busca de um rumo... Respondi:

Querida, conte comigo, o meu negócio é servir...

Quando estamos - como você diz - 'sem rumo', tratamos de buscar saídas, e o difícil é encontrá-las... Normalmente pendemos para as saídas fáceis... Lamento dizer que grandes problemas ou grandes questões, exigem saídas elaboradas... Desconfie sempre da verborragia fácil e barata, das "leis do retorno", "você pode", "desperte sua luz interior", e baratos afins... Basicamente, o desespero das saídas fáceis desemboca no mundo mágico - e placebo - da auto-ajuda, ou coisa muito pior... 

O que poderia ser 'muito pior'??? Religiões, espiritismo, astrologia, numerologia, freudismo, junguianismo, e esoterismos correlatos... Para desenvolver a capacidade, e a auto-suficiência para encontrar suas próprias respostas, precisamos de verdadeiro conhecimento -  multi-disciplinar -, experiências, e 'a capacidade de aprender com  as nossas experiências... Mas as pessoas tem mais ou menos dificuldade em aprender com suas próprias experiências... Muitas vezes, é necessário um 'mestre' ou 'mentor', mas é bem difícil cruzar com eles, rsrsrsrsr... 

Outro problema reside na inércia para aprender... O besteirol esotérico é apenas um boa fábula, como a novela das 20:00hs, que pode ser "aprendida" por muitos, pela massa... Mas é difícil indicar uma literatura adequada para quem pretende começar a aprender 'Como a Mente Funciona' - título homônimo da obra do fantástico Psicologia e Neurocientista Steven Pinker... Esta talvez não seja a melhor obra de Pinker para iniciantes... 'Tábula Rasa' pode ser o caminho, mas devo advertir, que apesar de ser uma leitura sensacional e agradável, em nada se parecerá com livros de auto-ajuda - ou deveria dizer auto-engano (?)...

Mas existem outros caminhos para entender o comportamento humano, a Genética é essencial, e nesta particular, um obra se destaca: 'O que nos faz humanos' - Matt Riddley... Se faz mister dizer que tais obras não oferecerão receitas mágicas, imediatistas, fáceis... Tais obra são antes de tudo, conhecimento efetivo, que uma vez absorvido, passará a integrar o seu próprio conjunto de conhecimento, e servirão para analisar as questões de sua vida, na tentativa de elucidá-las e ajudando você a formulas suas próprias respostas... 

Entre Pinker e Riddley, a imperdível obra de Daniel Dennett, 'Quebrando o Encanto', também servirá como fonte inesgotável de conhecimento sobre os porquês do comportamento, assim como promoverá um autêntico choque de realidade... 

'A Dança do Universo' de Marcelo Gleiser, te conduzirá pela deliciosa história do conhecimento humano, contribuindo para a maravilhosa compreensão sobre o seu lugar no Cosmo... Carl Sagan também é uma leitura indispensável, nesta indescritível experiência de habitar verdadeiramente, e pala primeira vez, o seu lugar no Cosmo... 'Bilhões e Bilhões' é a minha sugestão neste caso... Estas duas obras citadas neste parágrafo, foram editadas pela Companhia de Bolso, uma série econômica da Companhia das Letras...

Igualmente editadas pela Companhia de Bolso, estão as obras primas do Neurocientista Oliver Sacks, 'Tio Tungstênio' e 'Um Antropólogo em Marte'... Não se assuste com o título, Sacks é extremamente gostoso e fácil de ler...

O delicioso e esclarecedor livro de Fernando Reinach, 'A Longa Marcha dos Grilos Canibais - e outras crônicas sobre a vida no planeta Terra', é uma coletâneas de textos publicados por Reinach em sua coluna na revista Nature... Infelizmente esta obra-prima não fez alarde na mídia literária, até porque não é um livro para todos... Reinach tangencia em um breve capítulo nesta obra prima, a questão das dificuldades da aprendizagem...

"Gato escaldado tem medo de água fria" é um ditado popular que resume a questão do aprendizado pela dor, trauma, etc... Mas podemos aprender também com estímulos positivos... O Hipocampo, responsável - em grande parte - por nosso processo de memorização, trabalha sob efeito emocional... Emoções extremas, excitação, dor, ou medo, podem conduzir à um processo de memorização mais efetivo de nossas experiências, assim como a indiferença, o desânimo, e a apatia, podem induzir também o nosso Hipocampo pelo desprezo por aquela experiência... 

Aprendemos com as punições e com as recompensas, certo? Nem sempre... Um grupo de cientistas alemães entendeu e quantificou este processo, demonstrando o papel de um gene, um receptor de Dopamina (D2), sobre a nossa capacidade de aprendizado... Os experimentos mostraram que dependendo de uma forma alterada para este gene (D2+A1), os indivíduos não serão capazes de aprender com a mesma facilidade que aqueles que possuem a forma original (D2), mas apenas sob efeito da punição... Em relação ao aprendizado por estimulo, os dois grupos não apresentaram diferenças sensível... 

Desta forma, pudemos demonstrar que uma parcela de nossa população (D2+A1), tem dificuldades para aprender com os seus erros, ou a partir da respectiva punição... Isso é revelador... E pode nos indicar por exemplo, porque códigos morais punitivos, regidos pela experiência negativa - como as Instruções de Shuruppak, Bíblia, Corão -, tem menos eficácia do que as instruções positivas - Tao Te King, ou 'O Livro do Caminho e da sua Virtude', assim como 'A Conquista da Felicidade' de Bertrand Russell -, onde sugerimos como viver melhor, mas não educamos pelo erro ou pela punição...

Na instrução negativa é dito por exemplo "se você fizer isso, será morto por deus, e se ouvirá o ranger de seus dentes"... Na instrução positiva dizemos "faça isso e serás mais feliz, evite isso porque causa a dor"... Esta é a diferença básica entre a tradição sumeriana, reproduzidas nos livros judaico-cristãos-islâmicos, em contraste com a Filosofia Oriental, as ideias Iluministas de do Humanismo Secular...

Sabemos, já há algum tempo, que a Dopamina está relacionada com o nosso comportamento, e o gene em questão (D2), atua sobre os neuroreceptores para a Dopamina, enquanto grande parte da farmacologia associada à depressão, age diretamente na oferta de de Dopamina no cérebro... Todos possuímos duas cópias pare este gene (D2), mas algumas pessoas possuem uma destas cópias ligeiramente alterada (D2+A1), implicando em um número menor de neuroreceptores para a Dopamina no cérebro... Estamos falando de uma pessoas normal e lúcida, mas com uma variante para este gene, assim como possuímos variantes genéticas para a cor da pele,  ou cor do olho... Trata-se de uma variante dentro da normalidade... Embora acarrete certa desvantagem sobre o aprendizado - da mesma maneira que menos pigmentação com a melanina, diminui a nossa proteção UV...

O resultado dos testes surpreendeu a todos... Os voluntários com o gene em sua forma original (D2), foram capazes de evitar cometer erros já cometidos, em 70% dos casos, contra 50% - o que equivale à uma escolha aleatória - dos voluntários com a variante (D2+A1)... 

Vale ressaltar ainda, que estes resultados podem ajudar na compreensão da correlação entre a quantidade de receptores para a Dopamina e a propensão a vícios e obsessões, como o álcool, drogas, jogos e até mesmo a religião... A hipótese mais em voga, sugere que tais indivíduos, em função da maior dificuldade em aprender com seus erros, e experiência negativas, tornam-se mais suscetíveis à estes distúrbios ou vícios, na forma de uma repetição de tais atos... Na verdade, este cenário é um pouco mais complexo, e estamos avançando a passos largos, mas existem outros genes, e outros efeitos sobre o comportamento, que estarão alinhados com o D2, para explicar outras variantes do comportamento humano...

Mas pensem nas implicações morais, jurídicas, psicológicas e educacionais, em demonstrar um incremento genético, sobre a dificuldade de aprender com os seus próprios erros e com a punição...

Finalmente, gostaria de indicar o livro supra-citado de Russell, 'A Conquista da Felicidade'... A Felicidade precisa ser conquistada, e também dependemos de nossa genética para a 'potência desta ação de conquistar', e também na hora de nos sentirmos 'felizes'... A sensação de realização e felicidade, está muito mais relacionada com os nossos neuroreceptores e neurotransmissores do que com nosso entorno... Quem nunca viu uma pessoas sujeita à toda sorte de intempéries, presa à um cadeira de roda, e com outras desvantagens fisiológicas, mas que não para de sorrir... A facilidade em sentir-se feliz, é interior, mas não é sempre uma questão de 'escolha'... Normalmente não é...

Mas, a em nosso processo de auto-conhecimento 'efetivo', real, comportamental, neurofisiológico, bioquímico, podemos descobrir quem somos, e assim sermos de propósito, rsrsrsrsr... Ou efetuar alguns ajustes, estar atentos a alguns detalhes, mas ainda assim seremos quem somos... 

Somos quem somos sem intencionar sê-lo... Mas somos... E respondemos socialmente e legalmente por isso...

Carlos Sherman

Fonte de Pesquisa:  "Genetically determined   differences  in learning from errors", 
Science, vol. 318, p. 1.642, 2007

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