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segunda-feira, 1 de julho de 2019

ELOGIO À LOUCURA - E o Transtorno de Personalidade Narcisista e a Idolatria


Excerto de 50 TONS DE CONSUMO – QUAL É O SEU PREÇO
        | Carlos Sherman

ELOGIO À LOUCURA - E o Transtorno de Personalidade Narcisista e a Idolatria


A eloquência, em seu ponto mais alto, deixa pouco espaço para a razão ou a reflexão, mas se dirige inteiramente aos desejos e afetos, cativando os ouvintes dispostos e subjugando seu entendimento. 
David Hume

Entrevistadora: “Você soa consumista.”

Erika James: “Eu sou.”
 (autora de ‘50 tons de cinza’)



O desafio hodierno, na literatura e cinematografia, reside exatamente na criação de personagens mais realistas, que mantenham um mínimo de coerência psicológica; que mantenham algo de humanidade... Algo como a Poesia da Realidade... Humanos, troppo umanos, e maravilhosamente imperfeitos...

Então, você, um esposo dedicado, amoroso, e afetuoso, vai pegar um cineminha com a mulher amada, aquela para quem você fez votos de igualdade e companheirismo. E o enredo inclui uma menina tola e superficial sendo amarrada e espancada pelo seu algoz e... “amor”! Amor? Isso, enquanto você arregala os olhos, enche a boca de pipoca, e pensa: será que não estou reprimindo as minhas fantasias? Todos têm fantasias como essa? Não, não mesmo... Mas devemos esta dúvida a um charlatão e fanfarrão conhecido pela História por seu emblemático sobrenome: Freud.

As teses freudianas chocaram o mundo, mas não da forma como foram vendidas: uma espécie de estatuto e salvo conduto libertário contra as “repressões e recalques”... contra o conservadorismo e  a hipocrisia, e toda sorte de “negação”... Não! Freud cria uma seita, estabelece os seus marcos como crença, e senta-se no trono. Ele destrona Deus, e assume o seu lugar. E tem uma tremenda bronca de Nietzsche, já que este assumiu a tarefa de Meslier, que por sua vez assumiu a tarefa de Lucrécio: destronar todos os deuses!

O freudismo e os seus males está tão arraigado em nossa cultura que merece algum aprofundamento filosófico e muito de contraponto científico, para que desembaracemos de uma vez por todas esta terrível teia de mal entendidos, desconhecimento, e submissão crente e devota... O Teatro de Horrores Freudiano!

Comecemos pelo fim, comecemos por Deleuze, para quem o sadomasoquismo não passa da reles combinação do desejo de imputar dor através de “atos sexuais” por parte de uns, com o desejo de sentir dor por parte de outros (Frieza e Crueldade). E tudo parece muito “justo”, já que existe “consentimento” e um “acordo”... Deleuze argumenta - pomposa e freudianamente – que “o sádico realmente tenta destruir o ‘ego’ para unificar o ‘id’ e o ‘super-ego’”. Enquanto, para o masoquista, o desejo será intensificado por conta do “atraso na gratificação sexual”; portanto, sua frustração sexual é “recompensada” como a “frieza inabalável” do dominador... E esta baboseira é conhecida como “O Contrato”, o processo de controlar o outro, e transformando-se em alguém frio, cruel e insensível.

Tudo muito clichê, com amplo descompromisso com a realidade nua e crua... Em outras palavras, só porque um homem é sexualmente inseguro ou insatisfeito, ele estará mais propenso a amarrar as menininhas e chicoteá-las, a fim de se sentir melhor? Pois é exatamente isso que qualquer serial killer sexual compartilha com Christian Grey; afinal todos eles precisam afirmar o domínio sobre suas vítimas.

Como Gary Ridgeway, o green river killer, que matou pelo menos 80 mulheres, sendo o recordista norte-americano em crimes oficialmente creditados em seu prontuário. Gary tinha um apetite sexual insaciável; seduzia e encantava mulheres frágeis, prostitutas, ou alpinistas sociais como Ana... e as estrangulava... para depois jogar os seus cadáveres no rio Verde.

Que tal David Berkowitz, o “Filho de Sam”? Um assassino em série de Nova York, no final dos anos setenta, que matou vários casais. David não curtia cenas românticas, e quando topava com casais trocando beijinhos no carro, ou fazendo piquenique, o gatilho de sua “fantasia reprimida” disparava... A “explicação” dos “psicólogos” é simples, David não gostava de ver casais em cenas amorosas, já que não dispunha de ninguém para compartilhar uma companhia romântica. Mas esta é uma explicação estúpida e superficial... e sem nenhuma evidência científica; de forma que não difere em nada de uma “desculpa” - nos moldes freudianos.

Para mim, este mundo não é nada além de mal, e meu próprio mal aconteceu por causa das circunstâncias do que eu estava fazendo. - Aileen Wuornos

O “charmoso” Wuornos matou sete homens. Matar, em série, não decorre de experiências na infância. O charme do Sr. Grey, na verdade, é comum e necessário nos casos envolvendo assassinos sexuais em série, já que precisam atrair suas vítimas... Na verdade, eles usam o “charme” para construir uma base fatal de confiança...  Como Charles Shobhraj, “A Serpente”, ou ainda o “Bikini Killer”, acusado de drogar e matar mais de uma dúzia de turistas ocidentais na Ásia.

Charles – dizem os inquéritos e depoimentos - conquistava suas vítimas com o “charme” e carisma... e mesmo na prisão ele tinha uma seguidora e amante. Charles – pasmem vocês - se casou com a filha de seu advogado no Nepal.

O “assassino encantador” seduziu também os cineastas; e.g., no filme “Main Aur Charles”, o “assasino gostosão”, um personagem “enigmático”, e interpretado pelo ator Randeep Hooda. Um psicopata narcisista, sentenciado por sua neuropsicologia, por sua fisiologia e natureza, seduzindo um batalhão de vítimas e seguidores - também sentenciados por sua natureza frágil e idólatra.

Incapaz de sentir remorsos, exibicionista, malandro, sedutor, astuto, excessivamente confiante em seu intelecto, e relativamente culto, transformou-se em uma celebridade cinematográfica até o encarceramento definitivo e a sentença de prisão perpétua. Midiático, alimentou a imaginação da indústria do “entretenimento”, recebendo polpudos cachês por entrevistas, além de direitos em filmes, livros e documentários.
Em 30 de julho de 2010, a Suprema Corte nepalesa confirmou o veredicto emitido pelo tribunal distrital de Katmandu: a sentença de prisão perpétua pelo assassinato da cidadã americana Connie Jo Bronzich. O tribunal também ordenou o arresto de todas as suas propriedades.

Sua sogra, Shakuntala Thapa, e sua “esposa”, Nihita, filha de seu advogado, expressaram “revolta” com o veredicto, alegando que o direito de defesa havia sido “negado” a Sobhraj, e acusando o judiciário de “corrupto”. Ano após ano, crimes do passado continuam sendo creditados à ficha de Charles.

Richard Ramirez era um “stalker” como Christian Grey. Mais precisamente o “Night Stalker”, responsável pelo assassinato de 13 pessoas, além de 5 tentativas frustradas, 11 agressões sexuais, e 14 assaltos... Mas tudo isso não impediu que uma legião de fãs e admiradoras o adorassem como “príncipe encantado”... Apenas uma de suas devotas dedicaria 75 cartas de amor ao assassino, no período de 3 anos, até... casar-se com ele.

Os brutos também amam, certo? Não na vida real... Mas Ted Bundy não tinha nada de bruto, sendo considerado o serial killer “mais encantador da História”... Não existe uma contradição em termos neste título honorífico? Sim, e principalmente para quem violentou e mutilou ao menos 30 mulheres – em confissão.

O modus operandi de Bundy era no mínimo criativo; ele engessava o seu antebraço e se aproximava das vítimas pedindo ajuda; normalmente em áreas ermas e estacionamentos vazios. Sedutor, “encantador”, Bundy logo se via na companhia de suas vítimas indefesas... e o encanto cedia lugar ao terror. Estupro e tortura em vida, além do estupro dos cadáveres, para posterior mutilação. Um belo psicopata necrófilo! Um excelente personagem para um eventual “50 tons de vermelho”...

Paul John Knowles ficou famoso como “O Assassino Casanova”... Este homem, classificado como “maravilhosamente deslumbrante”, realmente seria um rosto apropriado para a próxima campanha da Hugo Boss, ou dirigindo um Audi R8... Talvez uma continuação do clichê “50 tons”, interpretando o filho atormentado do casal, e que passa a atormentar a vida de outras famílias...

O também narcisista John foi preso pela primeira vez aos 19 anos, por roubo. Gostou tanto da experiência que passou a frequentar a cadeia durante seis meses por ano. É acusado de haver matado 19 pessoas, mas alardeou o crime de pelo menos 35. Três delas teriam sido assassinadas a esmo na noite em que uma mulher, atendendo a pressões da família e de amigos, desistiu de casar-se com John.

O seu método de assassinato era o estrangulamento. E fico aqui pensando que a vida da jovem personagem de Ana só está começando... o Sr. Grey ainda pode lhe trazer muitas surpresas... Incesto, estupro, violência, e morte, sempre estão no cardápio de homens como Christian – na vida real...

Jeffrey Dahmer, o “Canibal de Milwaukee”, realmente “comia” suas vítimas... O “rapaz” matou, mutilou, cozinhou, temperou e comeu suas vítimas... E o sexo? Sim, ele manteve relações sexuais com os cadáveres de cerca de 17 homens e meninos. Sua última vítima em potencial descobriu o seu jogo e alertou a polícia, que o prendeu em flagrante delito. Na cadeia, Jeffrey não cativou tanto assim os “meninos”, sendo espancado até a morte, dois anos após sua detenção, por um companheiro de prisão.

Mas também existem belas mulheres, “charmosas” e assassinas; como romena de origem búlgara Vera Renczi... Vera afirmava que gostava de homens mais velhos, mesmo quando ainda era uma menina de 15 anos... Ela foi acusada de pelo menos 38 assassinatos; começando com o “marido”, que ela envenenou com arsênico, alegando que ele a havia traído e abandonado, e tendo forjado correspondências para justificar o fato.

Quando se casou, Vera tinha 20 anos, e o alvo seria o banqueiro austríaco Karl Schick, muito mais velho que ela. Uma tarde, durante um ataque de ciúmes, Renczi envenenou o vinho do marido com arsênio e começou a dizer à família, amigos e vizinhos que ele a havia abandonado, a ela e ao seu filho Lorenzo. Depois de um ano de luto, informou a todos que o marido fugitivo havia falecido em um acidente de carro. E a estória colou...

Ela, rica, não se casaria mais; e passaria os anos seguintes em uma série de casos amorosos com homens casados, solteiros, e de todos os extratos sociais. Todos os relacionamentos terminavam em poucos meses, semanas, ou alguns dias após a torrente romântica. E, sempre, os “infiéis a haviam deixado”.

Finalmente, em uma tarde qualquer, uma das esposas de um de seus amantes o seguiu até a mansão de Renczi; mas este homem jamais voltaria para casa... A polícia foi chamada, descobrindo na adega de Renczi 32 caixões prontos para o enterro, e contendo cadáveres masculinos em diversos estados de decomposição.

O filho Lorenzo morreu por azar... Inadvertidamente, durante uma visita à mãe, ele desceu para pegar um “vinho”, e então passou a chantageá-la. Encontrou o seu destino em um cálice “batizado” pela “mãe”... Em sua versão melodramática e manipuladora, alegou que “abraçou-o enquanto morria, para que ela fosse a última pessoa que o abraçasse” – “por ciúme”.

Foi condenada por 35 assassinatos e sentenciada à prisão perpétua... Mas na visão “psicanalítica”, Vera só estava “à procura do amor”; apontando para a “perda”, a “traição”, e blá, blá, blá... Mas vamos aos fatos: Vera se casa com um ricaço bem mais velho e o mata. Infidelidade era o menor de seus problemas, casando-se com um homem bem mais velho... e riquíssimo. Depois sai com homens casados, e que ela bem sabe serem casados, e fala em “traição”? Finalmente mata o filho que a chantageava. Mas, psicopata de carteirinha e manipuladora de primeira grandeza, trata de conduzir a trama para o mesmo amargo fim: o ciúme doentio e passional. Só que existem 32 caixões para provar que tal monstruosidade requer vetores bem mais poderosos... Estamos falando em severos transtornos mentais; e que não podem ser tomados como mera consequência comportamental, fruto da experiência, frustrações etc... Não, tal comportamento é tão malévolo, precedido por tanta frieza, sem remorsos, arrependimentos, sem humanidade... Estratagemas que só podem ser engendrados por uma mente fisiologicamente doente.

Não podemos permitir que salas decoradas em estilo vienense abriguem conversações inócuas, e quase sempre prejudiciais, enquanto transtornos severos deixam de ser medicados. Essa é uma questão de saúde pública. Estou denunciando a prática da Psicologia no Brasil, e mais diretamente a prática da Psicanálise. Para lidar com a mente humana é necessário conhecer a mente humana segundo o corpus de conhecimento consagrado no Terceiro Milênio. A visão hidráulica e mágica da prática psicológica no Brasil não leva qualquer vantagem sobre o papo no bar, a visita à cartomante, ou a leitura do horóscopo... Mas deixa você mais pobre, e com mais problemas – desta vez, de ordem financeira...

Vera tem um sem número de seguidoras e admiradoras na Internet...

O líder de seita, e chefe da “família Manson” - uma espécie de comuna-hippie californiana -, matou 9 pessoas durante um período de cinco semanas; entre elas a atriz Sharon Tate - que estava grávida. Quando o líder “carismático” foi para a prisão, seus seguidores e fãs entraram em desespero... No ôba-ôba da contracultura, Manson posa ao lado de psicóticos “charmosos” e assassinos como Che Guevara, em camisetas conclamando “paz e amor”.

Hiroshi Maeue, “O Assassino do Website Suicida”, encarna uma tendência perigosa no Japão: o “suicídio assistido”. Já que tal cultura, no passado, fomentou o suicídio como maneira “honrada” de morrer, muitos ainda recorrem ao ofício na tentativa de solucionar distúrbios de depressão. Um exemplo claro de um comportamento cultural, um costume, que pode encontrar a mente certa – ou errada -, resultando em tragédia.

Este cenário macabro abriu espaço para sites onde suicidas em potencial, em uma cultura que enaltece o suicídio, encontrem outros suicidas dispostos a um terror em grupo... Uma cultura repressiva, machista, e que oferece o suicídio como saída honrosa em caso de “vergonha”, é um cenário perigoso para as Disforias de Gênero, e Transtornos Sexuais. Ao mesmo tempo oferece o igualmente perigoso caminho da fantasia, como no estranhíssimo “Cosplay”, onde variâncias de gênero e transtornos psíquicos são maquiados e escondidos por trás de uma doentia fuga da realidade... em grupo...

Estou afirmando que, no caso japonês, e um caso único no planeta, a variedade de gênero em relação ao comportamento não é encarada publicamente, ficando travestida de muitas formas, por trás da aparência singela de uma cultura pop alienada. Quero dizer aqui que a diversidade de gênero deve ser tratada de forma natural, humana... o direito inalienável às liberdades individuais, o direito ao afeto...  Mas assumir-se implica exatamente em despir-se de medos... fantasias e alegorias, para olhar-se frente a frente... e sem auto-caricaturas.

Hiroshi sofre de Transtorno Sexual Parafílico, do tipo Fetichismo Transvéstico (DSM-V); que resulta, no seu caso, em um desejo compulsivo de vestir-se como mulher. É o desejo de vestir-se de acordo com o gênero oposto, dentro de uma ótica bi-gênero, ou seja, masculino e feminino. Hoje sabemos que existe o gênero anatômico, o gênero social, e o gênero neuropsicológico - muito mais amplo, complexo, diverso, variado...   

Na realidade o Fetichismo Transvéstico pode denotar uma dificuldade em flexibilizar o comportamento diante de uma armadura social de gênero. Um homem que gostaria de ser mulher, mas não pode enfrentar o seu mundo desta forma. E mais, um homem que não percebe a variedade de alternativas entre ser homem ou mulher, ou não pode aderir às variantes de gênero por conta das mesmas muralhas que restringem e demarcam os papéis sociais.

Não existe, no cérebro, ser homem ou mulher, apenas... Existe uma variância entre os extremos aceitados como masculino e feminino. Poderíamos considerar o extremo masculino como caracterizado pelo territorialismo, dominância, violência; enquanto o pólo feminino tende a apagar estes traços... Mas são apenas vetores da personalidade, embora poderosos.

No caso de Hiroshi, usar peças de roupas do sexo oposto como “fetiche” servia ao propósito de alcançar a excitação sexual. Isso não significa que Hiroshi queira ser penetrado – não necessariamente. Caracterizamos como um transtorno quando esta prática gera desconforto para quem pratica, afetando suas relações sociais, trabalho, relacionamentos.

Mas Hiroshi tinha ainda outros fetiches, e macabros... como “assistir a um rosto em agonia”. Assim, ele atraiu suas vítimas com a promessa de morrerem juntos; mas ele as matou, e as viu morrer em agonia... Um asseverado sadismo, a partir do desespero de suas vítimas; deprimidas sim, mas não dispostas ao masoquismo. Não havia acordo algum, mas o cheiro inefável da morte!

Robert Ben Rhoades não era bonitão... Ele apenas oferecia carona para as suas vítimas, e depois as levava para a sua câmara de tortura; sim, ele tinha uma câmara de tortura, igualzinha a de Christian Grey... igualzinha ao “Red Room Of Pain” - ou “Quarto Vermelho da Dor”; onde Robert estupraria, torturaria, e mataria as suas vítimas.

Dennis Nilsen, ou “O Assassino Gentil”, não era lá essas coisas; mais um assassino necrófilo, com transtornos diversos, e Disforia de Gênero... Um Transtorno Parafílico é uma perversão ou tara que causa sofrimento ou prejuízo ao indivíduo que a pratica; e cuja satisfação implica em dano ou risco de dano pessoal a outros. No caso da Parafilia de tipo Necrofilia, o dano é irreversível!

Mas, em matéria de sadismo, Elliot Roger é um “clássico”; e uma inspiração direta para Christian. Com apenas 22 anos, Elliot encontrava dificuldade em dormir, e então pensou: “acho que vou matar algumas pessoas por aí”... Elliot era o molde perfeito para Christian Grey: rico, filho de um diretor de cinema, bonito, e frustrado sexualmente. Em um vídeo gravado antes da matança, Elliot expõe essa frustração:

Eu tenho 22 anos e ainda sou virgem. Eu nunca beijei uma garota. Eu estive na faculdade por dois anos e meio, e talvez mais do que isso, na verdade, e ainda sou virgem. Tem sido muito torturante. A faculdade é a época em que todos experimentam aquelas coisas tais como sexo e divertimento e prazer. Dentro desses anos, eu tive que apodrecer na solidão. Não é justo. Vocês nunca se sentiram atraídas por mim. Eu não sei por que vocês, meninas, não são atraídas por mim, mas vou puni-las por isso. É uma injustiça, um crime, [...] Eu não sei o que você não vê em mim. Eu sou o cara perfeito e ainda assim vocês se jogam pra esses homens desagradáveis ​​em vez de mim, o cavalheiro supremo.

Esqueçam as imbecilidades freudianas sobre repressão, recalques, a vontade de transar com a mãe, matar o pai etc... Elliot tem severos transtornos mentais de ordem fisiológica, e precisa sim de fármacos...

Mas ele se considerava um “cavalheiro masoquista”, como Christian Grey. O único problema era que ele não havia encontrado uma vítima capaz de tamanha submissão, frieza e insensibilidade... Ele não havia encontrado a sua Anastasia... Então ele simplesmente matava as descontentes. E era tão impávido em seu masoquismo, que ele esperou por horas até que uma menina saísse de um Domino’s pizza, para então entabular um papo que seria culminado por uma “foda gloriosa” – no melhor estilo Sr. Grey:

Eu não faço amor, eu fodo ... duro.

E de quem seria esta fala? De Elliot ou de Christian?

Só podemos deduzir, pelas tortuosas e superficiais linhas da Sra. James, que o tal Christian é um camarada desprovido de qualquer sentido de empatia; o que dirá de AMOR? Ele não sente absolutamente nada exceto por seu pênis latejante e dolorido, e uma suposta carnalidade “alfa dominante”; ao que adicionaria megalomania, psicose, tirania, egocentrismo, egoísmo, machismo misógino, narcisismo, e infantilidade... Ele é basicamente um “fodedor” completamente vazio, e que chupa o dedinho abraçado ao ursinho.

Não sei se adoro os seus pés ou espanco a merda de vida que existe em você.

Grey ou Roger? E esse cara, esse mesmo cara, será o par perfeito no final...

Eu me deito na nossa toalha de piquenique tartan e olho para o céu azul claro de verão, vejo o campo emoldurado por flores do campo e grandes ervas verdes. O calor do sol de tarde de verão aquece a minha pele, meus ossos e minha barriga, e eu relaxo, meu corpo dançando a Jell-O. É tão confortável. Claro que não... isso é maravilhoso. Eu saboreio o momento, um momento de paz, um momento de contentamento puro e absoluto. Eu deveria me sentir culpada por sentir esta alegria, estar completa, mas eu não me sinto. A vida aqui e agora é boa, e eu aprendi a apreciar e viver o momento como o meu marido. Eu sorrio e me contorço e minha mente voa para a memória deliciosa de ontem à noite em nossa casa no Escala...

E esta novela mexicana de baixo orçamento retorna aos porões BDSM:

Os fios do chicote ardendo em toda a minha barriga inchada e dolorida, num ritmo lânguido.

Nada disso corresponde à realidade em termos de personalidade humana... Nenhum homem capaz de atrocidades que o assemelham a um serial killer seria capaz de converter-se em “um amor de pessoa”... Não existem Christians Greys por aí... mas muitas mulheres que acreditam nesta farsa podem encontrar o seu Elliot Roger... ou... Alexander Boettcher...
O cara, Alexander Boettcher, investia pesado na aparência, adepto contumaz da malhação, muita grana fácil no bolso, e um ego de dar inveja a qualquer dos narcisistas supracitados... E, como eles, um adepto da dominação sexual, e total... Mais um paciente com Transtorno Parafílico, sem direito a sursis... Qualquer semelhança com o personagem Christian Grey, e com o casal Grey, não é mera coincidência. Reflitam comigo...

O italiano exibido de 30 anos se casou com a bela modelo croata Gorana Bulog. Como todo bom narcisista, exibicionista, “dominador”, Alexander era um canastrão mentiroso, e obcecado pela conquista de mais e mais atenção, fãs, e amantes... Foi quando Alexander conheceu a submissa Martina Levato em um bar; uma frágil estudante de 20 anos. A atração foi devastadora – para ela. A partir daí, Martina se tornaria escrava de Alexander – exatamente como Anastasia Steele.

Mas, na realidade, os Alexanders e Christians, não são convertidos por suas vítimas... e jamais! O controle de Alexander sobre Martina era tal que ele chegou a marcar no rosto dela as iniciais de seu nome com um bisturi; e como prova da “eterna devoção” – dela, a ele.

Na cama, ele a obrigava – assim como às suas demais amantes - a tratá-lo por “rei” – quase G-rey. Mas, assim como o próprio, assim como o Sr. Grey, Alexander também possuía em sua mansão um quarto “Vermelho”, com os seus “inofensivos” apetrechos sadomasoquistas - que a cultura pop tristemente batizou de BDSM.

A relação entre Alexander e Martina também envolvia ménages sexuais, sempre definidas pelo playboy - que ganhava dinheiro no mercado financeiro. As parceiras do casal também se submetiam a todos os caprichos de Alexander. Uma dessas mulheres disse, segundo o Daily Mail, que precisava pedir “autorização” do “mestre” para tocá-lo... Mas todas essas frágeis e oportunistas vagabundas eram regiamente remuneradas.

Finalmente, Alexander ordenou que Martina se encontrasse com os seus ex-amantes,  para então jogar ácido em seus rostos. O objetivo, segundo o “mestre”, era “purificá-la”. Uma das vítimas foi Pietro Barbini, ex-namorado de Martina quando os dois ainda eram adolescentes. O rosto de Pietro foi deformado por ácido clorídrico, e ele precisou reconstruir as pálpebras e o nariz em várias cirurgias. Pietro ainda tentou convencer Martina a abandonar Alexander, mas acabou subindo para o topo da lista de “purificação”, conforme o desejo de seu “amo e senhor”. Outros homens foram vítimas da “escrava” de Alexander, apenas por um descompromissado beijo na boca.

A dupla foi presa e condenada a 14 anos de prisão. Ainda segundo o Daily Mail, o “casal” não apresentava qualquer sinal de remorso; o que claramente caracteriza aos dois como psicóticos, dominante e dominada. O juiz encarregado do caso alegou que o “casal” pode ser considerado “mais perigoso do que qualquer mafioso ou terrorista”. Alexander disse em juízo que sua “escrava” agia por conta própria, tentando livrar a própria pele; e ainda teve a cretinice de dizer que só estava sendo alvo da Justiça por ser rico.

O cinema, além das páginas policiais, também já retratou o “erotismo” e a parafilia em outras oportunidades; e.g., no filme “Shame” (“Vergonha”), onde o protagonista “Brandon” arrisca a própria vida, assim como a vida de seus convivas, em uma entrega baseada no sofrimento; realizando livre e doentiamente suas “fantasias” – id est,  transtornos -, enquanto obedece irrefreavelmente a seus impulsos sexuais.

Aspectos como: (1) o tempo excessivo gasto em tais práticas, a exemplo do Sr. Grey -, o que é inteiramente contraproducente com a vida de alguém que trabalha e mantém relações sociais; (2) além do modo como reage à ansiedade, depressão, tédio, irritabilidade, e situações mais ou menos estressantes em sua vida; (3) assim como a insistência na vã tentativa de livra-se de tais impulsos, a sensação de culpa, e a dificuldade em contê-los; (4) e o fato de não estar sob efeito de psicotrópicos, medicamentos, drogas diversas, álcool etc.; servem para classificá-lo, sem demora, e segundo o DSM-V, como portador de um Transtorno Parafílico. Um transtorno sim, e não um “estilo”, como um mero praticante de golfe, filatelia, ou do modismo comercial cunhado por BDSM! Os Grey, Sr. e Sra., precisam de tratamento... urgente! Mas isso, só se o casal existisse na “realidade”...

Carlos Sherman

SOB A SOMBRA DE FREUD – Um Teatro de Horrores








Excerto de 50 TONS DE CONSUMO - QUAL É O SEU PREÇO
        | Carlos Sherman

SOB A SOMBRA DE FREUD – Um Teatro de Horrores
   
Você pode ignorar a realidade, mas não pode ignorar as consequências de ignorar a realidade. 
Ayn Rand
                       
A mente é seu próprio lugar e ela está em si mesma. Pode fazer Céus do inferno, e também inferno de Céus.  
John Milton


A diferença entre o antídoto e o veneno pode estar na dose... A diferença neuropsicológica entre meras variantes do comportamento humano, que merecem ser entendidas e respeitadas, e os transtornos psíquicos de comportamento, está na dificuldade com que o segundo grupo enfrenta as diversas relações sociais em suas tormentosas vidas, e como encaram suas relações afetivas, profissionais, políticas e sociais.

Mais adiante, trataremos da última edição do DSM-5, ou Manual de Diagnóstico e Estatística em Transtornos de Personalidade; por ora, gostaria apenas de pontuar que existem limites e contornos para uma vida psíquica saudável e produtiva, sendo o consumo compulsivo, a dominância extrema, a agressividade despropositada, a idolatria submissa e subserviente, impeditivos para uma vida feliz... e impeditivos para a própria vida.

Contrariando o conceito freudiano de Tânatos, ou Pulsão de morte, que atuaria “sempre”, embora antagonizado pelo contraponto da pulsão de vida, ou pulsão sexual, Eros; gostaria de dizer que tal diagnóstico nada faz senão indicar outro conceito muito vívido em nossa psique: o maniqueísmo. A ideia de oposições aplicadas a tudo em nossas vidas... certo, errado, bom, mal... preto no branco. E aqui também vale pontuar outro conceito inato: a segregação. E a homóloga obsessão pela diferenciação, muitas vezes dicotômica, entre “nós e eles”. Nós, brancos ou pardos, contra eles, negros... pena azul contra pena branca, palmeirenses contra corintianos... republicanos e democratas, conservadores e liberais.

Tais desígnios neuropsicológicos são tão reais e tangíveis, que nortearam o caminho da humanidade... E não precisamos apelar para o ôba-ôba freudiano, nem para a forjada compulsão universal e masculina de transar com a própria mãe, e por isso pretendendo matar o próprio pai... Esta frágil fundação do edifício freudiano já ruiu há muito tempo, juntamente com todos os seus conceitos vazios, pomposos e autoritários; e os destroços desta teoria gótica já não dizem nada.

O estratagema do freudismo consiste em problematizar as questões, e muito além do que os fatos permitem; com o firme e nefasto propósito de embrenhar sua vida em um labirinto pantanoso, do qual só poderemos sair com a ajuda de um psicanalista... mesmo que este dia nunca chegue. Em resumo, a psicanálise pode ser resumida à seguinte frase: “te vejo na próxima consulta”.

Mas por que estou aludindo a Freud e seus delírios megalomaníacos e ambiciosos? Porque é exatamente nesta fonte que bebem os defensores do BDSM, alegando que nada há de doentio em suas práticas...

O homem enérgico e bem-sucedido é aquele que consegue transmutar as fantasias do desejo em realidade. – Freud (‘Cinco lições sobre a Psicanálise’)

Nem todo desejo é saudável, necessário ou bom... Nem todo comportamento decorre de arquétipos, ou da interação entre “Tânatos e Eros”, nem de recalques e desejos sórdidos reprimidos, nem de um mundo de fantasias. Em geral, os transtornos de personalidade causam muito sofrimento, sendo este o caso dos personagens francamente irreais de “50 tons”.

Mas, e de acordo com “Três Ensaios de Sigmund Freud sobre a Teoria da Sexualidade”, Christian Grey não passa de um “recalcado” que não foi “amamentado suficientemente”... Sobre impingir a dor a outro ser humano, Freud postulou que:

[...] a mais comum e importante de todas as perversões.

Agregando que o masoquismo é uma forma de “sadismo contra si mesmo”. O masoquismo - segue o bidu vienense - decorre da culpa e de um “desenvolvimento incorreto da criança”, e nos remete ao “seio da mãe”. E ele sacou tudo isso em um passe de mágica, e sem jamais executar qualquer tipo de confrontação científica de suas teses com a realidade... Melaine Klein, sucessora do mestre, melhor exprime o conceito:

O sadismo atinge o seu ponto culminante ao longo da fase que se inicia com o desejo sádico-oral de devorar o seio da mãe (ou da própria mãe) e que termina com a chegada do primeiro estágio anal. Durante este período, o objetivo principal do sujeito é se apropriar do conteúdo do corpo da mãe e destruí-la com todas as armas que dispõe o sadismo. – Melaine Klein (‘Essais de psychanalyse’; 1948; p.263)

Não, você não leu errado... e a referência está logo acima; confira! Klein está dizendo que o “sadismo” do bebê “atinge o seu ponto culminante” no que chama de “desejo sádico-oral”, quando o indefeso bebê pretende “devorar o seio da mãe”; e onde o “objetivo principal do sujeito” é – pasmem vocês - destruir a mãe e se “apropriar do conteúdo”, das entranhas de seu “corpo”... com “todas as armas que dispõe o sadismo”... Estamos falando de um bebê recém-nascido, longe de estar em condições de exprimir qualquer tipo de material bélico contra a sua mãe, longe de ser capaz de engendrar qualquer estratégia assassina contra a própria mãe.

A natureza não é tão estúpida, e não destruirá o corpo que abriga, protege, e a alimenta a sua própria vida. Nem meios, nem motivos, nem razões, nem lógica, nem nada... este é o mundo mágico freudiano... E tem mais – acomode-se porque é assustador:

No interior do corpo da mãe, a criança espera encontrar: o pênis do pai, excrementos e crianças, todos esses elementos sendo assimilados a substâncias comestíveis. [...] Esses excrementos são transformados, na fantasia, em armas perigosas: urinar equivale a recortar, socar, queimar, afogar, enquanto as matérias fecais são assimiladas a armas e projéteis. – (Ibidem)

Sem palavras...

Para Freud e Klein, não existe a mais remota possibilidade da criança estar apenas faminta, e com dificuldades de coordenar a sucção no bico do seio da mãe... E já que o bebê real, no mundo real, dorme muito nessa fase, sua missão de extermínio materno não será de forma alguma bem sucedida – como de fato não é. Esse bebê frágil e indefeso precisará de alguns anos até ser capaz de perpetrar qualquer ato letal! E tenho advertido sobre a afinidade da mente humana com a máxima de Tertuliano, e principalmente quando me defronto com religiões e crendices como o freudismo e o marxismo:

Credo quia absurdum! (Creio porque é absurdo!) - Tertuliano de Cartago

Notem que este importante líder da cristandade no século II não está dizendo que “crê embora seja absurdo”; ele diz claramente que “crê porque é absurdo”, exortando o absurdo, fazendo a apologia cristã sobre os absurdos de seu credo... E assim caminha a humanidade, de absurdo em absurdo! E seguimos...

Melaine Klein, a exemplo de Freud e seu círculo eclesiástico e monástico, jamais se importou com evidências ou provas. E se você ainda não está convencido desta necessidade, devo citar Aristóteles, para quem as fêmeas eram inferiores aos machos, com “cérebros menores” (Sobre as Partes dos Animais; 350 AEC), que ele confundia erroneamente com o coração; e também evidenciado por possuírem - entre outras infâmias - menos dentes (Sobre a História dos Animais; 350 AEC).

E antes que invoquem a contextualização, devo adverti-los de que outros pensadores à mesma época, e mesmo antes, não pensaram em afirmar tais asneiras... O problema aqui é outro, e remete à natureza de Aristóteles, e sua personalidade neuropsicológica. O “filósofo”, tendo sido casado duas vezes, nunca se deu ao trabalho de contar os dentes de suas “inferiores” esposas. Notem o desprezo deste “mestre” pela prova; pelo valioso e revolucionário princípio do Onus probandi – ou ônus da prova. Mas notem também, e com ainda mais atenção, a certeza de Aristóteles em sua autoridade! A mesma sina que dirigiu Freud, Marx, Lênin, Hitler, Fidel, Moisés, Maomé, às massas  - Ipso facto...

Melaine Klein, renomada “psicóloga” e “psicanalista”, conterrânea do “mestre”, representa a linhagem ou seita de cunho freudiano com maior número de seguidores em nossos dias. Um frequente e grave erro é considerar que Klein rompe com o freudismo, e ao contrário; Klein rompe com o annafreudismo, ou a facção que segue cegamente os desmandos da filha de Freud - Anna. Em 1945, a “Sociedade Britânia de Psicanálise” promove a divisão do credo em três seitas distintas: os “annafreudianos”, ou seguidores de Anna Freud; os “kleiniano”, ou seguidores de Melaine Klein; e aqueles que continuam cultuando a mensagem do “mestre”, ipsis litteris, e sem intermediários... Mas Klein é sem sombra de dúvida a maior representante do freudismo legítimo; o que considera também, entre tantas consonâncias, o seu alinhamento em termos de personalidade com o “mestre”... Klein encarna a figura autoritária, dogmática, carismática, e soturna, de Freud... A visão de Klein e os contornos de seu universo são tão grotescos quanto de seu mestre.

Klein, que conheceu e trabalhou com Freud, é a grande baluarte do movimento, mesmo após o racha no pós-guerra... E o “mestre” já não está vivo para opinar, mas os fatos falam por si. Anna não passa de uma figura patética, do tipo “o goleiro é filho do Pelé” – e daí? Já Adler, Rank, Jung, e Reich – para citar os discípulos diretos -, são pseudo-dissidentes, já que seguem uma linha similar, afastando-se apenas da obsessão freudiana pela “repressão sexual” – quando muito. Ganharam a vida como psicanalistas e ponto final! Jung teve ainda a cara de pau de criar a “psicologia analítica” - em lugar da “psicanalítica” freudiana! E ainda saiu disparando contra o antigo mestre por praticar uma doutrina “não científica”; para então postular outros disparates igualmente não científicos. O sujo falando do mal lavado, e ambos na lama intelectual da história da psicanálise. 

Freud não passa de um psicótico, um charlatão, alguém a ser classificado também pelo DSM-V, considerando o dano causado à humanidade - e a si mesmo. Klein, portanto, e de fato, é o único elo póstumo com o mestre, até o advento de Lacan, propondo um “retorno a Freud”... Mas, e apesar do jogo de cena, Lacan sai da cena deixando o seguinte legado lapidar - em indefectível estilo mea culpa:

Nossa prática é uma trapaça, blefar, fazer as pessoas pestanejarem, impressioná-las com palavras astuciosas, é de qualquer forma o que se costuma chamar de engodo. [...] Do ponto de vista ético, nossa profissão é insustentável; é, aliás, justamente por isso que eu fico doente só de pensar nela, porque eu tenho um supereu como todo mundo. [...] Trata-se de saber se Freud é ou não um acontecimento histórico. Acredito que ele fracassou no seu golpe. É como eu; em muito pouco tempo ninguém mais se importará com a psicanálise. - Jacques-Marie Émile Lacan (Conferência proferida por Lacan em Bruxelas em 26 de Fevereiro de 1977, transcrita na íntegra pela revista Le Nouvel Observator, no. 880, de Setembro de 1981, p.88)

Duro, e mordaz...

E chegamos aos nossos dias com Françoise Dolto, e o firme comando xiita de Elisabeth Roudinesco – que nada fez pela humanidade, mas muito combateu em favor da corporação freudiana...

Considerem mais uma vez que as absurdas doutrinas de Melaine Klein versam sobre o desejo de bebês recém nascidos em assassinar suas próprias mães - fonte e manutenção primária de suas vidas. Mas por que nos deter na análise dos recém-nascidos? O buraco pode ser mais embaixo... Esta sina assassina pode começar no próprio útero... Absurdo? Não para Freud e Otto Rank - outra eminência parda psicanalítica. Sobre Rank, Freud exalta que:

[Rank é o] seu mais fiel colaborador [...] detém uma compreensão extraordinária de psicanálise. – Freud (‘Zur Geschichte der psychoanalytischen Bewegung’; 1914; p.63)

Rank tem uma visão ainda mais “profunda” do sofrimento no puerpério. Rank publica, em 1924, uma pomposa e engenhosa teoria, segundo a qual:

[...] todos os fenômenos psíquicos – inclusive o coito e o complexo de Édipo – são interpretados em função do trauma do nascimento. Ele crê, assim, ter chegado a um nível mais “profundo” do que aquele que Freud tinha chegado. Afirma que a fonte última da angústia é retornar ao seio materno. – Jacques Van Rillaer (‘Mitologia da Terapia Profunda’)

E mais uma vez nenhuma prova é apresentada, ZERO! Mas Rank trata de engendrar sua hermenêutica em qualquer parte, com especial interesse por personalidades históricas.

Sócrates é verdadeiramente o precursor direto da terapêutica psicanalítica [...] ao aceitar a morte que facilmente poderia ter evitado [...] conseguindo superar intelectualmente o trauma do nascimento.  – Rank (‘O Trauma do Nascimento’; 1924; p.184)

Isso me recorda uma visita com o meu pai à Livraria Cultura do Conjunto Nacional em São Paulo, quando me deparei com o livro que afirmava que “Jesus Cristo era Maçom”. O meu pai então me disse que havia algo ainda mais “profundo”, pois havia um fulano que defendia a ideia de que “Adão era Maçom” - Quia absurdum!

Mas seguimos o caminho de Rank para dentro do útero, e daquilo que ele considera a nossa sina em vida: “angústia”! Quando bastaria dar uma olhada no DSM-V para classificar este transtorno obsessivo de Rank; que, a julgar pelo sofrimento impingido a tantos pacientes mal atendidos, além de seus próprios tormentos, certamente mais lhe valeriam um leito na internação – não o lugar do mago.

Inspirado por Otto Rank, outro psicanalista renomado, pertencente ao círculo dileto de Freud, Ferenczi, publica Thalassa – uma alusão à mitologia grega, “o espírito primordial do mar”... Na “obra”, ele sentencia:

O desejo edipiano é a expressão psíquica de uma tendência biológica muito mais geral, que impele os seres vivos ao retorno ao estado de calma do qual gozavam antes do nascimento. – Ferenczi (‘Thalassa’)

Ou seja, o ato sexual não é mais do que a tentativa de retornar ao seio materno, e depois ao útero materno – pasmem vocês...

Ferenczi imagina que os anfíbios e répteis foram incitados a criar um pênis a fim de restaurar o modo de vida perdido [...]. - Jacques Van Rillaer (‘Mitologia da Terapia Profunda’)

Em suas próprias palavras, o pênis serviria então para:

[...] restabelecer a existência aquática no interior da mãe, úmido e rico em nutrientes. - Ferenczi (‘Thalassa’)

Existência aquática para seres pulmonados? E o “pênis” da mulher? Um cataclismo achológico quase sem precedentes! E pode piorar... na forma de delírios alegóricos:

A mãe é, na realidade, o símbolo do Oceano ou seu substituto parcial, e não o inverso. – (Ibidem)

“E não o inverso” é particularmente cretino... Que falastrão, que viagem, que verborragia sem nó nem dó! Em outras palavras, a “obra” de Ferenczi afirma, sem qualquer comprovação, que o sono e o coito existem para que retornemos simbolicamente à vida aquática!

Você [Ferenczi] é o primeiro a explicar por que o homem quer praticar o coito. Este não é um enigma fácil. – Freud (‘Carta a Ferenczi em 11 de Maio de 1924’)

Explicar? Enigma? O sexo é a base da vida, da Evolução, da Seleção Natural, da sobrevivência como espécie...

E Adler, Stekel, Jung, Ferenczi, Reich, Roudinesco, todos evocaram o conceito de “profundidade da alma”, quando não sabiam bem o que dizer... Puro imbróglio verborrágico! Puro invencionismo imperativo e categórico! Onde está a Ciência, o Conhecimento, a comprovação? Onde está a Ética, a responsabilidade, o sentido de consequência... a seriedade?

[...] a psicologia não é uma ciência, [...] é a última transformação da teologia. – Augusto Comte (‘Curso de Filosofia Positiva’; 1842)

Existem diversos e complexos transtornos de personalidade. Tomemos um fato histórico, o famoso conflito entre os Hatfield-McCoy, deflagrado entre as respectivas famílias no final do século XVII nos estados da Virgínia Ocidental e Kentuchy - nos Estados Unidos; foram 12 mortos entre as duas famílias.

Freud, se as famílias pudessem pagar pelas consultas, teria feito referências ao berço, à frieza das mães, à gestação, à violência no lar, e obviamente a um asseverado ambiente de repressões sexuais... Mas a realidade passa bem distante de todo este devaneio. Hoje sabemos que os descendentes dos McCoy portam o gene para a síndrome de von Hippel-Lindau, um gene de expressividade variável, mas que explicaria o mal temperamento do clã... Não, a solução nunca esteve no divã!

A VHL é uma condição genética e hereditária autossômica dominante, que de maneira variável quanto à sua expressão predispõe seus portadores a tumores malignos no cérebro, olhos, parte interna dos ouvidos, rins, pâncreas, além da glândula adrenal; resultando em temperamentos explosivos, violentos e inesperados... como observados na genética do clã McCoy. E nenhum desse paranoicos matadores chupava o dedinho em sua "fase oral" antecipando o  que viria a ser uma bala de 38 prestes a sair de um cano fumegante...

Freud? Um delírio!!! E o prenuncio de muitos males modernos... por ignorância!


Carlos Sherman





O QUE NOS TORNA HUMANOS - As vicejantes fronteiras da Neuroplasticidade



As vicejantes fronteiras da Neuroplasticidade
Por Carlos Sherman

A plasticidade neural é um fato; não obstante, muita besteira tem sido dita sobre o tema. Existem limites para o fenômeno, assim como como períodos críticos e “janelas” nas quais as conexões neurais se reorganização, complementam ligações, e até mesmo encontram novos caminhos. As janelas de tempo mais sensíveis à dita plasticidade neural são também conhecidas por imprintings... uma alusão à uma espécie de marca que funcionará como uma conexão neural estável, muitas vezes irreversível.
Tomemos a visão; nascemos com o aparato ótico bem formado, o globo ocular, o cristalino, a retina, e lá estarão os cones e bastonetes, o nervo ótico... mas a circuitaria final no Lobo Occipital ainda precisará terminar o seu trabalho, e não bastarão os marcadores de desenvolvimento neural; serão necessários fótons, luz, excitação dos cones e bastonetes, para que as terminações que decodificam a visão terminarem o seu papel no Córtex.
Em 1990, nos pântanos do Danúbio, um garoto de seis anos, e sua amiguinha de infância, ganharam um patinho - cada. Os patinhos os seguiam a toda parte, relacionando as crianças a seus pais. Essas crianças cresceram e se casaram. Estamos falando de Konrad Lorenz - casado com Gretl. Lorenz foi um renomado zoólogo, etólogo e ornitólogo austríaco, e ganhou o Nobel de Fisiologia/Medicina de 1973 por seus estudos sobre o comportamento animal. Mas o seu maior feito, no entanto, foi a observação do fenômeno batizado de imprinting. O imprinting pode ser descrito como uma espécie de marca - irreversível - deixada sobre o cimento fresco do desenvolvimento ontogenético. Observamos imprintings sobre a finalização do sistema visual, sobre a fala, sotaques, e até mesmo em laços afetivos - como o reconhecimento do rosto da mãe, que no caso dos patinhos começou com um menino, de terminou como um cientista de cavanhaque.
Lorenz trabalhou com gansos, e descobriu que se o filhote ganso tivesse menos de 15 horas, ou mais de 3 dias, não sofreria imprinting - neste caso, em relação ao rosto materno. Neste período, o primeiro candidato, e que passasse algum tempo com o gansinho, seria adotado como pai - irreversivelmente. Isso não quer dizer que não tenhamos outras formas de adotar pais, mães, avós, tios, etc. Mas o imprinting é uma experiência diferente, e tem o status de uma marca natural, inata, de uma impressão física sobre o comportamento - quase um desdobramento da genética.
Voltando ao imprinting, e por exemplo no caso da audição, o rei mongol Akbar, o Grande, no século XVI, isolou várias crianças ao nascer, e que eram cuidadas por mulheres impedidas de falar com elas até os 13 anos - idade em que ele ascendeu ao trono. O objetivo era verificar se tais crianças apresentariam uma tendência inata a tornarem-se hindus, muçulmanas ou cristãs. Na verdade, o Akbar conseguiu foi demonstrar que sofremos imprinting também em nosso sistema auditivo ao nascer. Todas as crianças se tornaram irreversivelmente surdos-mudas; mas nenhuma delas apresentou qualquer inclinação religiosa.
Temos os casos dos meninos selvagens - além de Mogli - Victor, Kaspar Hauser, e o grotesco caso de Genie. Genie foi confinada, amarrada, torturada, por uma mãe cega e abusiva, e um pai paranoico, que costumava latir e rosnar na porta de seu quarto escuro enquanto ela chorava. Ela passava todo o tempo enjaulada sobre a cama. Genie, depois de resgatada de seu suplício, nunca conseguiria aprender a falar, concatenar expressões, e organizar frases. Ela só conseguia balbuciar duas palavras quando foi encontrada: "stopit", "nomore". Genie aprendeu outras palavras, mas nunca foi capaz de estruturar uma frase. Genie se tornou obcecada por colecionar objetos plásticos, entre muitas outras obsessões.
Sua recuperação foi tão terrível quanto sua vida. O pai se suicidou. Houve certo progresso no início dos tratamentos, mas as equipes que assistiram Genie finalmente jogaram a toalha. Ela ainda está viva, internada em um lar para retardados mentais, sob severa vigilância.
O rei Psamético do Egito, Frederico II - imperador do Sacro Império Romano - e o rei Jaime IV da Escócia fizeram experiências de isolamento com crianças. No caso de Frederico, para saber sobre a nossa tendência linguística inata: hebraico, árabe, latim ou grego? O resultado foi a morte de todas as crianças.
Sessenta anos antes de Lorenz, o naturalista Spalding havia descrito o imprinting em animais. Lorenz e Spalding estavam conectados pelo estudo do imprinting. Spalding antecipou muitas descobertas neurocientíficas; descrevendo, e.g., como um pintinho recém-nascido “seguirá qualquer objeto em movimento. E, quando guiado apenas pela visão, ele não parecerá ter uma disposição maior para seguir um pato do que um porco ou um ser humano [...]. Há o instinto a ser seguido, e a audição, anterior à experiência [que começa no útero - grifo meu], trata de ligá-lo ao objeto certo [a galinha - grifo meu]".
Spalding descreveu extraordinariamente como um pintinho encapuçado “foge dele” quando descoberto; mas, se descoberto um dia antes, “correria para ele”, seguindo-o por toda parte. Lorenz, resgatou tais ideias e cunhou o termo imprinting - esse “lapso de tempo em que a experiência age irreversivelmente sobre o comportamento”. Como marcas no cimento fresco, e muitas vezes, finalizando sistemas neurais, como a visão e a audição, e atuando também sobre referências afetivas. Considerem a força do imprinting, considerem a força da educação, na tenra infância.
Filhotes de ganso seguem qualquer coisa que se mova na infância, como descobriu Lorenz. E apesar do seu sucesso com patos, ele não pôde repetir sua experiência com patos selvagens. Ele até imitou o som deles, mas não deu certo... Em 1960, Gilbert Gottlieb estudou patos selvagens percebendo que estavam fadados aos chamados de sua própria espécie. Mas Gottlieb fez algo interessante e terrível: ele emudeceu os patinhos ainda no ovo, cortando suas cordas vocais, e adivinhem? Eles passaram a ignorar os sons de sua própria espécie.
Considerem a seguinte questão: Em 1989, David Barker analisou o destino de mais de 5.600 jovens, nascidos entre 1911 e 1930 em uma cidade no sul da Inglaterra. Aqueles que tiveram menor peso ao nascer vieram a apresentar mais altas taxas de mortalidade por doenças cardíacas isquêmicas. O risco era de quase 03 vezes em relação às crianças mais pesadas. Essa é uma das provas de que os problemas cardíacos são menos dependentes do que você come.
Barker estendeu a pesquisa para outros países com os mesmo resultados, de forma que, concluiu ele: "se nenhuma destas crianças tivesse sido magra ao nascer, o índice da doença coronariana cairia pela metade mais tarde”. Isso também pode ser considerado um imprinting – um papel da dita plasticidade neural. Barker descobriu que comutadores genéticos consideram que o corpo do bebê mal nutrido será mal nutrido por toda a vida.
Lorenz ganhou o Prêmio Nobel com Niko Tinbergen, e eles fundaram a Etologia. Mas na época da guerra, e graças a Hitler, eles foram presos. Lorenz, na verdade, foi preso pelos russos; Tinberger foi preso pelos alemães. Tinberger lutou na resistência holandesa; mas não foram felizes em seu intento, e os alemães mantiveram o controle de boa parte da Holanda. Neste período, exatamente em função da resistência, além das greves de trabalhadores holandeses, o comando alemão na Holanda ordenou um corte de suprimentos e alimentos. Mais de 10.000 pessoas definharam até a morte neste período de fome. Neste mesmo período havia cerca de 40.000 gestações em curso; e resultado de tais gestações, sob efeito da fome, seria registrado cientificamente, assim como o peso dos recém nascidos, sem deixar dúvidas. Na década de 60, pesquisadores da Universidade de Colúmbia estudaram os dados e descobriram bebês malformados, altas taxas de mortalidade infantil, e altas taxas de natimortos. Mas o mais importante foi que eles descobriram algo notável: somente os bebês que estavam no último trimestre de gestação, neste período de penúria, sofreram com o baixo peso. Estes bebês apresentaram mais tarde problemas como diabetes, como resultado - pasmem - do conflito entre o seu fenótipo econômico em contraste com a nova abundância de alimentos. Os bebês que viveram o período de penúria no início de gestação nasceram com bom peso, mas quando atingiram a vida adulta, surpreendentemente, deram a luz a bebês incomumente pequenos.

Pat Bateson observa que gafanhotos levam várias gerações para passar de uma conduta social solitária para a um comportamento social gregário, e depois começam de novo. São necessárias várias gerações para o ser humano oscilar entre os fenótipos econômicos e esbanjadores - de calorias. Isso explica, por exemplo, porque a Finlândia tem uma taxa de mortalidade por problemas cardíacos 04 vezes maior que a França.
O governo da França começou a suplementar rações para mães grávidas depois da guerra franco-prussiana na década de 1870. E a Finlândia vivia em relativa pobreza até 50 anos atrás. Sendo estas as primeiras gerações a experimentarem abundância de recursos e calorias, e consequentemente a sofrerem mais problemas coronarianos. Um evento pré-natal pode ter longo alcance, impossível de neutralizar ao longo da vida. Mesmo algumas sutis diferenças podem ser atribuídas a imprintings pré-natais. Lembrando que o ambiente pré-natal não pode ser compartilhado exceto por gêmeos. Sendo assim, as injúrias sofridas neste período como a desnutrição, uma gripe, ou a excessiva exposição à testosterona, serão notadas por todo a vida, como uma instrução genética.
Não é por acaso que a fraudulenta Psicanálise se mostrou tão inepta em mudar pessoas, afinal o infindável processo sempre foi bem lucrativo: “te vejo na semana que vem”...
Uma série de experimentos foram conduzidos para ilustrar o poder do imprinting. Em muitas espécies de aves, observou-se que um filhote macho criado por uma mãe adotiva de outra espécie sofre imprinting sexual pela espécie da mãe adotiva. E existe sempre um período crítico para isso, que varia de espécie para espécie, entre algumas horas, a no máximo alguns dias. Entre 05 e 15 horas, e 02 e 03 dias.
A exposição à testosterona exerce imprinting na gestação, afetando o gene HOX que controla o tamanho dos órgãos genitais, assim como o tamanho dos dedos. O imprinting sofrido fica então registrado nos dedos – bem-dotados... Por exemplo, na maioria dos homens, o tamanho do dedo anular é maior do que o indicador. Nas mulheres, os dois dedos são em geral do mesmo tamanho. Uma mulher exposta excessivamente à testosterona, no útero, apresentará maiores dedos anulares. Os homens com dedos anulares incomumente longos - e veja a importância das correlações estatísticas - apresenta muito mais risco de estar associado ao autismo, dislexia, gagueira, disfunção imune, mas estranhamente geram mais filhos. Homens com dedos anulares extremamente curtos, apresentam elevado risco de doenças cardíacas e infertilidade.
Voltando aos gansos, Lorenz sacou que filhotes de ganso, além de outras aves, marcados por imprinting em relação a ele, não só o tratavam como pai, mas pareciam sexualmente fixados nele.

Matt Riddley conta que ele e a irmã descobriram na infância que uma rola-de-coleira, uma pequena ave, apaixonou-se pelos dedos das mãos e dos pés da irmã dele; provavelmente porque foram alimentados por eles desde o nascimento. Mas a “paixão” de uma rola, neste caso uma pequena rolinha, não pode ser parametrizada com tanta segurança.
Está claro há muito tempo que as preferências sexuais são fixadas no início da vida, senão no útero; e serão muito difíceis de mudar ao longo da experiência. Não existem cientistas sérios que realmente considerem que a sexualidade seja definida na adolescência. “A adolescência meramente revela o negativo da película.” (Riddley; 2008).
Blanchad aposta na ordem dos nascimentos cruzada com o peso, e o sexo dos irmãos antecessores, para justificar um dos fatores que aumentam dramaticamente a incidência do homossexualismo. No caso do homossexualismo masculino, é necessário que existam pelo menos um dois ou três irmãos antecessores do sexo masculino. Irmãs predecessoras não afetam a estatística. Isso, cruzado com o peso do bebê. Isso porque a mãe produz anticorpos contra a testosterona – um importante marcador no desenvolvimento fetal no caso dos machinhos... e a mãe se torna cada vez mais eficiente nesse processo, filho após filho, se machos em sequência.
Normalmente um segundo bebê é mais pesado que o primeiro do mesmo sexo. Os meninos são especialmente mais pesados se nascem após uma ou mais irmãs. Mas embora o segundo menino seja mais pesado que o primeiro menino, o terceiro tende a ser menor, e menor que o primeiro - inclusive. Blanchard demonstrou que meninos nascidos após um ou mais irmãos são em geral pelo menos 170 gramas menores ao nascer quando se tornam gays. Assim como Barker, Blanchard acredita que a genética e a vida uterina formam o bebê para a vida.
As paróquias luteranas registravam todos os marcos das vidas de seus fiéis, e seus arquivos foram de grande valia para o estudo do imprinting no útero - uma verdadeira mina de ouro para a Ciência. Eram registros que remontam do século XVI, mas que a partir de 1749, passaram a cobrir toda a população finlandesa.
Ao comparar, e.g., a história de vida de pares de gêmeos do mesmo sexo com pares de gêmeos de sexos dispares, notou-se que as meninas que dividiam o útero com um irmão - um gêmeo fraterno - apresentavam um sucesso reprodutivo muito menor. Meninas gestadas na companhia de outra menina tiveram destino idêntico ao dos meninos, 95% se casaram e 90% tiveram filhos. Em média essas meninas tiveram 05 filhos - uau, luteranas não tomam pílula, rsrsrs... dos quais 03 sobreviveram após os 15 anos. Meninos que dividiram o útero com meninas apresentaram o mesmo destino.
Mas o impressionante aconteceu com as meninas que dividiram o útero com um irmão; apenas 80% se casaram, mas só 65% tiveram filhos. Em média 03 filhos, e somente dois alcançaram os 15 anos. O estudo mostrou também que o resultado não era devido à convivência com outro irmão, afinal mesmo quando o gêmeo masculino morria ao nascer, e a menina era educada na companhia de outra irmã, ou mesmo analisando meninas que não foram gêmeas fraternas em convívio com irmãos, a estatística se mantinha inabalável.
Apesar do sexo feminino ser o default nos mamíferos, a explicação mais provável decorre da produção de testosterona pela gestação dos meninos, que atravessa a placenta e afetam as meninas. O mesmo fenômeno pode ser observado em inúmeras espécies. A testosterona bagunça o sistema de marcadores neurais da menina, de forma que sua funcionalidade feminina se vez grandemente afetada.
É até fácil inferir a existência de períodos críticos durante os quais o cimento fresco neurofisiologia, da formação da personalidade ou mesmo do caráter pode ser marcado pelo imprinting. Mas não é tão simples compreender como isso funciona. O que ocorre no cérebro para que um filhote de ganso sofra imprinting de um professor? Os experimentos mostram, e.g., que quando um filhote recebe imprinting de seus pais estas lembranças são estabelecidas em uma parte do hemisfério esquerdo do cérebro, chamado IMHV (intermediate and medial hyperstriatum ventral). Um surto de mudanças acompanha o imprinting, e os neurônios alteram sua forma; as são estabelecidas, e alguns genes e comutadores são ativados. Sabemos disso, em parte, porque se o IMHV for danificado o filhote não sofrerá imprinting dos pais.
McCabe observou que o GABA - um neurotransmissor - é liberado pelas células cerebrais no IMHV – lado esquerdo - durante o imprinting.  No final do período crítico, a liberação do GABA é reduzida.
Até a década de 1930 crianças que nasciam com catarata e estavam cegas somente sofriam intervenção cirúrgica após os dez anos de idade, e quando já era muito tarde. Era simplesmente muito tarde para que o Sistema Visual pudesse aprender a ver, mesmo depois da remoção da catarata. Hoje o problema é solucionado mais cedo e a criança pode aprender a ver, distinguindo profundidade e forma adequadamente.
Macacos criados na mais completa escuridão durante os primeiros seis meses de suas vidas, levam meses para distinguir círculos de quadrados; algo que seria naturalmente aprendido em dias. Durante os primeiros meses de escuridão o cérebro não consegue decodificar o que os olhos veem, e importantes conexões neurais serão bloqueadas ou perdidas para sempre.
Mas existe um senão, o imprinting mostra que nem a imagem da mãe e nem a cultura infantil são inatas, stricto sensu; mas a sua capacidade de receber tais marcas sim. A Genética controla o gap, a janela de tempo, para os diferentes tipos de imprinting. Desde as glândulas sudoríparas, a visão, a audição, a preferência por alimentos, rituais etc... uma criança é rigorosamente marcada em todos os sentidos. Os imprintings selam o processo de desenvolvimento de nossa natureza, em interação com o meio.
Vejamos o sotaque: mudamos o nosso sotaque facilmente na infância e na juventude. Mas entre os 15 e 25 anos, variando de pessoa para pessoa, esta capacidade simplesmente desaparece. A partir de então, já não será possível absorver alguns inflexões e hábitos do novo ambiente linguístico. Isso vale também para sotaques regionais. Os adultos retêm o sotaque de sua juventude, e os jovens adotam o sotaque que os rodeia. Lenneberg afirmou que a capacidade de aprender a linguagem termina abruptamente na puberdade.
Um bebê humano nasce prematuramente... podemos afirmar. Um cavalinho nasce e cavalga, enxerga e come sozinho. Um bebê humano é totalmente dependente da ajuda de seus pais ou pares adultos. E a força física, ao longo da evolução, cedeu lugar à força estratégica de nossos lações sociais. De forma que um bebê humano estará pronto quando a socialização cumpre o seu papel, e este período crítico no desenvolvimento tem as suas janelas abertas até os 05, 06 anos de idades, e principalmente quando a região Ventral Medial do Lobo Pré-Frontal, sela o seu destino. Que só poderá ser reordenado ou destruído, em caso de severo traumatismo, ou tumores – vide caso Phineas Cage.
Despois deste período, boa parte de nosso destino em termos de personalidade social estará selado. Diferentemente de outras regiões do cérebro, principalmente na parte sensorial e motora, a personalidade não é facilmente moldada. Vale considerar que em nossa vida como caçadores-coletores, em clãs de 100 a 300 pessoas, as crianças só acompanham seus progenitores, principalmente a mãe, até esta idade... 05 e 06 anos. É neste período que a empatia mostra seus limites, e crianças autistas e não autistas se diferenciam – vide teste Sally-Ann. Também nessa fase termina o desenvolvimento do ToM, ou Theory of Mind, responsável por boa parte de nossas estratégias em comunicação: (1) O que será que ele achou do que eu disse? (2) O que será que ele pensou sobre o que eu disse sobre ela? Etc...
Finalmente uma anedota, um caso real, para exemplificar a plasticidade em caso de traumatismos ou danos às conexões neurais... Tenham em mente o engenhoso Mapa de Penfield, onde o pé está contíguo aos órgãos genitais. Portanto, se uma pessoa perde a perna e é estimulada nos órgãos genitais, experimentará sensações na perna fantasma, já que existirá confusão sensorial, irradiando informação procedente da genitália para a perna... e vice-versa. Veja o diálogo de V.S. Ramachandran com um de seus pacientes a respeito (Ramachandran; 2010):

- É o Dr. Ramachandran?
- Sim.
- Sabe, doutor, li algo sobre seu trabalho no jornal, e é realmente empolgante. Perdi minha perna abaixo do joelho há dois meses, mas ainda há alguma coisa que não entendo. Gostaria da sua opinião. De que se trata? Bem, sinto-me um pouco embaraçado em contar isso.
Eu sabia o que ele ia dizer.
- Doutor, toda vez que tenho relações sexuais, tenho sensações em meu pé fantasma. Como o senhor explica isso? Meu médico diz que não faz sentido.
- Veja uma das possibilidades é que os órgãos genitais estão bem perto do pé nos mapas do cérebro. Não se preocupe.
Ele riu nervosamente.
- Tudo isso é perfeito, doutor. Mas o senhor ainda não está entendendo. Veja, sinto realmente o orgasmo no meu pé. E, portanto, é muito mais intenso e maior do que costumava ser, porque não está mais confinado aos meus órgãos genitais.

Os pacientes não inventam essas histórias. Fazendo um trocadilho com o famoso livro de Sacks, O homem que confundiu sua mulher com um chapéu, Ramachandran bem poderia publicar O homem que confundiu o seu pé com o pênis. Daí podem decorrer parte dos fetiches sexuais envolvendo os pés... A explicação freudiana não poderia ser mais ridícula e forçada, como tudo em Freud: “o pênis se assemelha ao pé”. Ao pé? Não mesmo... talvez o nariz... Mas o pé não tem nada a ver com pênis, a começar que são dois pés, e terminam em dedos.
Mas o que acontece quando o pênis é amputado? O carcinoma do pênis às vezes é tratado com amputação, e muitos desses pacientes sentem um pénis fantasma, e até ereções fantasmas! Nesse caso, seria de esperar que uma estimulação dos pés fosse sentida no pênis fantasma. Um paciente assim acharia especialmente delicioso dançar sapateado!!!
E o caso da mastectomia? Um neurologista italiano, Dr. Salvatore Aglioti, descobriu recentemente que certa proporção de mulheres submetidas a mastectomia radical sentem nítidos seios fantasmas. Mas, que partes do corpo estão mapeadas perto dos seios? Verificou-se que quando estimulamos regiões perto da clavícula, adjacentes ao tórax, ou partes do esterno, as sensações são sentidas no mamilo do seio fantasma. E  o respectivo mapeamento ocorreu apenas dois dias depois da cirurgia.
Aglioti descobriu ainda que um terço das mulheres com mastectomia radical relatavam formigamento, sensações eróticas em seus mamilos fantasmas, precisamente quando os lóbulos das orelhas eram estimulados. Mas Isto só acontecia no seio fantasma, não no real. Aglioti concluiu que no mapeamento sensorial os lóbulos das orelhas também estão próximos ao mamilo, assim como a áreas sensíveis na vagina. Isso explica por que mordiscadas na orelha fazem parte das preliminares sexuais. Por outro lado, no caso de mamilos fantasmas existe um caminho preferencial irrigando área que já não traz estímulos sensoriais.
A personalidade, e.g., está encravada em nossa fisiologia; e mesmo a aprendizagem está limitada pelo desenvolvimento fisiológico de nossas estruturas neurais. Nos Estados Unidos, nos últimos 25 anos, muitos psicólogos do desenvolvimento se transformaram em cientistas cognitivos, passando a estudar o cérebro em busca da compreensão sobre o desenvolvimento. Uma pergunta crítica para os cientistas cognitivos é: existe correlação entre os estágios comportamentais universais do desenvolvimento e os estágios fisiológicos e de transformação neural. Por exemplo, se o aprendizado da matemática começa a acontecer em certa idade, será que existe uma estrutura cerebral específica ou um conjunto específico de neurónios que se desenvolvem ao mesmo tempo para tomar conta da aprendizagem de matemática? A resposta parece ser sim: existe uma correlação entre mudanças neurais e desenvolvimento cognitivo.
Correlatos neurais de mudanças cognitivas foram investigados na percepção, na atenção, na memória, na linguagem, nas habilidades motoras e em processos mentais como o raciocínio. Mas é importante lembrar que simplesmente observar uma correlação entre desenvolvimento neural e cognitivo não significa necessariamente que as mudanças cerebrais causaram as mudanças comportamentais. Afinal de contas, também existe uma correlação entre a altura e o comportamento da criança, mas é improvável que o tamanho físico seja responsável pelo desenvolvimento cognitivo. No entanto, esses experimentos fornecem evidências convergentes que são consistentes com um vínculo causal.
Existem ao menos dois importantes motivos para o desenvolvimento cerebral: (1) o amadurecimento funcional de estruturas; (2) a conexão com outras estruturas. No processo de poda sináptica, por exemplo, conexões sinápticas frequentemente utilizadas são preservadas, enquanto caminhos pouco utilizados serão abandonados pelo cérebro.
As conexões neurais se assemelham a uma intrincada rede de possibilidades, enquanto as sinapses são bioquímicas. O cérebro do bebê desenvolve muitos mais caminhos e conexões do que o necessário. E depois, na poda, uma política rígida entrará em cena: “use ou perca”...
Uma vez que essas conexões estejam estabelecidas, o cérebro trata de torná-las permanentes pelo reforço. E um dos processos envolvidos nesta sedimentação é a mielinização, que consiste em envolver o neurônio (axônio) em uma bainha de mielina, e garantindo assim que a velocidade neste neurônio seja maior. Só depois que certas conexões cerebrais estejam estabelecidas é que os bebês estarão aptos para desenvolverem determinadas habilidades cognitivas. A ideia de que a aprendizagem é limitada pelo desenvolvimento do cérebro, ou pelo menos estreitamente ligada a ele, é um conceito novo e estimulante, energizado pela revolução biológica na ciência psicológica.
Finalmente, a plasticidade deve ser olhada com critério e reserva, já que o conceito é muito amplo, e já que existem limites para esse expediente fisiológico. E é exatamente essa a fronteira para o desenvolvimento: a fisiologia. Mas parte desse processo decorre da Genética, da Gestação, da Finalização do Desenvolvimento Fetal... e parte é regenerativa. Não podemos confundir todos esses papéis com apenas um conceito que sai de uma nuvem, criando um sem número de possibilidades quase mágicas. Porque não é assim que funciona a plasticidades... e ela tem limites.


Carlos Sherman