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domingo, 22 de abril de 2012

Telenovela Neurocientífica: Lorenz, Spalding, Russell



(...) Acabei de sair de uma discussão sobre o livre-arbítrio, e me despedi com as seguintes palavras: 'O livre-arbítrio é uma falácia que serve e serviu para justificar as 'cagadas' de deus... Se deu certo foi deus, se não deu 'fodeu-se'... Rsrsrsr... Mas se deu certo foi deus, se não deu então foi o homem... Esta era a essência da falácia do livre-arbítrio... Basta um pouco de Genética e Neurociência, para saber que não funciona assim... O hipocampo registra o que quer na memória, e não controlamos nada de fato... A intensidade deste registro depende de nosso estado emocional, que também não controlamos, de fato... Ou seja, o que registraremos ou não, o que nos marcará ou não, o que afetará a nossa vida e a nossa experiência, não depende de nossa vontade... Os imprintings da experiência em nossa infância selaram em parte nosso destino, como marcas sobre o cimento fresco da genética e da ontogenia... Considere a genética, nossa neurofisiologia, a memética... Somos quem somos sem intencionar sê-lo... Nas palavras de Schopenhauer: "O homem pode, é certo, fazer o que quer, mas não pode querer o que quer." - Arthur Schopenhauer... Temos desejos, vontades próprias, mas não podemos escolher o que vamos querer e nem o que iremos desejar... Isso decorre de uma cadeia complexa, involuntária, e que apenas parece ser voluntária quando coordenamos as ações no córtex neuromotor...'

Mas o que é o imprinting?


Em 1990, nos pântanos do Danúbio, um garoto de seis anos, e sua amiguinha de infância, ganharam cada um um patinho... Os patinhos os seguiam a toda parte, relacionando as crianças a seus pais... Essa crianças cresceram e se casaram... Estamos falando de Konrad Lorenz - casado com Gretl... Lorenz foi um renomado zoólogo, etólogo e ornitólogo austríaco, e ganhou o Nobel de Fisiologia/Medicina de 1973, por seus estudos sobre o comportamento animal, a etologia, etc... Mas o seu maior feito, no entanto, foi a observação do 'imprinting'... O imprinting pode ser descrito como uma espécie de marca - irreversível - deixada sobre o cimento fresco do desenvolvimento ontogenético... Observamos imprintings em laços afetivos, como o reconhecimento do rosto da mãe - no caso dos patinhos um menino, que poderia ser um cientista de cavanhaque -, sobre a 'finalização' do sistema visual, sobre a fala...

Lorenz trabalhou com gansos, e descobriu que se o filhote ganso tivesse menos de 15 horas, ou mais de 3 dias, não sofreria imprinting - neste caso, em relação ao rosto materno... Neste período, o primeiro candidato, e que passasse algum tempo com o gansinho, seria adotado como pai... Irreversivelmente... Isso não quer dizer que não tenhamos outras formas, pela experiência de adotar pais, mães, avós, tios, etc... Mas o imprinting é uma experiência diferente, tem o status de uma marca natural, inata, de uma impressão física - quase um desdobramento da genética - sobre o comportamento...


Lorenza sucumbiu aos perigos das utopias, e cometeu os seus 'pecados', mas esta é uma outra estória na história...

Voltando ao imprinting, Por exemplo, no caso da audição, o rei mongol Akbar, o Grande, no século XVI, isolou várias crianças ao nascer, e que eram cuidadas por mulheres que não falavam com elas, até os 13 anos - idade em que ele ascendeu ao trono... O objetivo era verificar se tais crianças apresentariam uma tendência inata a se tornariam hindus, muçulmanas ou cristãs... Na verdade o que conseguiu foi demonstrar que sofremos imprinting também em nosso sistema auditivo ao nascer... Todas as crianças se tornaram irreversivelmente surdo-mudas... Mas nenhuma delas apresentou qualquer inclinação religiosa...


Temos os casos dos meninos selvagens - além de Mogli - Victor, Kaspar Hauser, e o grotesco caso de Genie... Genie foi confinada, amarrada, torturada, por uma mãe cega e abusiva, e um pai paranoico, que costumava latir e rosnar na porta de seu quarto escuro quando ela chorava... Ela passava parte do tempo enjaulada sobre a cama... Genie depois de resgatada de seu suplício nunca conseguiu aprender a falar, concatenar expressões, e organizar frases... Ela só podia balbuciar duas palavras quando foi encontrada: "stopit", "nomore"... Genie aprendeu outras palavras, mas nunca foi capaz de estruturar uma frase... Genie se tornou obcecada por colecionar objetos plásticos, entre muitas outras obsessões...


Sua recuperação foi tão terrível quanto sua vida... O pai se suicidou...Ouve certo progresso no início dos tratamentos, mas as equipes que assistiram Genie finalmente jogaram a toalha... Ela ainda está viva, internada em um lar para retardados mentais, sob severa vigilância...

O rei Psamético do Egito, Frederico II - imperador do Sacro Império Romano - e o rei Jaime IV da Escócia fizeram experiências de isolamento com crianças... No caso de Frederico, para saber sobre a nossa tendência linguística inata: hebraico, árabe, latim ou grego? O resultado foi a morte de todas as crianças...

Mas o que Lorenz tem a ver com Spalding e este com Russell? Sessenta anos antes de Lorenz, o naturalista Spalding havia descrito o imprinting em animais... De forma que Lorenz e Spalding estavam conectados pelo estudo do imprinting... O filósofo e economista inglês, famoso pelo utilitarismo, Stuart Mill, deu a Spalding o cargo de tutor do irmão mais velho de Bertrand Russell... 

Os exóticos pais de Russell, consideravam um erro que o 'tuberculoso' Spanding se reproduzi-se... Mas consideravam a sexualidade essencial, e nisso concordamos plenamente... Então decidiram diverti-lo, sexualmente... A própria Lady Amberley, mãe de Russell, se encarregou de dar prazer a Spanding, e ao que consta estava muito feliz com o prazer recebido... Ela caprichou no 'sexual healing' de Spading, mas morreu precocemente... Seu marido morreu em seguida, dois anos depois, mas a tempo de nomear Spalding tutor de Bertrand Russell...


O avô de Russell, quando soube da 'sem-vergonhice' ficou chocado, assim como a conservadora sociedade vitoriana, e acabou tomando a guarda do jovem, ao mesmo tempo que a tuberculose vencia Spanding....

Spanding, o herói desta tragédia grega, antecipou muitas descobertas neurocientíficas... Descreveu por exemplo como um pintinho recém nascido "seguirá qualquer objeto em movimento. E, quando guiado apenas pela visão, ele não parece ter uma disposição maior para seguir um pato, do que um porco, ou um ser humano (...) Há o instinto a ser seguido, e a audição [que começa no útero - grifo meu] anterior à experiência trata de ligá-lo ao objeto certo [a galinha - grifo meu]"....

Spalding descreveu extraordinariamente como um pintinho encapuçado 'foge dele' quando descoberto... Mas se descoberto um dia antes, 'correria para ele', seguindo-o por toda parte... Lorenz, resgatou tais idéias, e cunhou o termo imprinting, este 'lapso de tempo em que a experiência age irreversivelmente sobre o comportamento'... Como marcas no cimento fresco, e muitas vezes, finalizando sistemas neurais, como a visão e a audição, e atuando também sobre referências afetivas... Considerem a força do imprinting, considerem a força da educação...


Carlos Sherman




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